Pular para o conteúdo principal

Conselho de administração: nomear políticos ou técnicos? Por Mansueto Almeida

bndes O blog do Mansueto Almeida é um dos melhores da língua portuguesa em geral, e do Brasil especificamente, isso por que Mansueto não se furta de apresentar dados trabalhados de maneira sólida e escreve com independência e principalmente conhecimento.

No texto que agora transcrevo, com autorização do autor, Mansueto busca demonstrar como é a composição dos Conselhos de Administração das estatais, no caso do BNDES que nos últimos anos se incorporou ao arsenal da política externa brasileira, portanto se tornou órgão de interesse para os analistas de Relações Internacionais.

Visitem o blog do Mansueto para obter informações e análises a cerca dos temas da administração pública e das contas nacionais.

Conselho de administração: nomear políticos ou técnicos?

Por Mansueto Almeida

Algo que sempre me chamou atenção é a pressão de governos democráticos para acomodar os seus aliados em órgãos públicos. No caso do Brasil, dada a importância das estatais financeiras e não financeiras, esses órgãos acabam sendo também utilizados para acomodar políticos, mas a extensão dessas nomeações muda ao longo do tempo o embate técnico versus político muda também.

Vejamos, por exemplo, a formação do Conselho de Administração de uma das instituições de melhor quadro técnico do Brasil, o BNDES. Para a minha surpresa e a pedido de um amigo dos EUA que está escrevendo sobre o assunto, fiquei surpreso com o número de políticos no conselho de Administração do Banco. E alguns dos técnicos não têm independência para se posicionar diretamente contra à vontade do governo.

Conselho de Administração do BNDES em setembro de 2013

1) Presidente do Conselho: Fernando Pimentel – Ministro do MDIC. (Político);

2) Vice-presidente do Conselho – Luciano Coutinho – Presidente do BNDES (Técnico);

3) Mauro Borges Lemos: Presidente da ABDI. (Técnico);

4) Vagner Freitas de Moraes – Presidente Nacional da CUT e filiado ao PT (Político);

5) Carlos Lupi – Ex- ministro do Trabalho e um dos líderes do PDT. (Político)

6) Roberto Átila de Amaral Vieira – ex-presidente do PSB (Político).

7) Orlando Pessuti: filiado ao PMDB do Paraná. (Politico);

8) Eva Maria Cella Dal Chiavon – Secretária-executiva do MPO. (, Político);

9) Márcio Holland de Brito – Secretário de Política Econômica. (Técnico);

10) Luiz Alberto Figueiredo Machado – atual Ministro das Relações Exteriores. (Técnico).

Conselho Fiscal (setembro de 2013)

1) Valdir Moysés Simão. Ex-presidente do INSS e Secretário Executivo do Ministério do Turismo (Técnico);

2) Luizianne de Oliveira Lins. Ex-prefeita de Fortaleza do PT. (Político);

3) Paulo Fontoura Valle – Subsecretário do Tesouro Nacional. (Técnico).

Sabem o que falta no Conselho do BNDES? um grupo de pessoas independentes que não estejam vinculadas diretamente ao governo. Há vários desses notáveis, alguns inclusive com passagem pelo próprio BNDES. O conselho atual do BNDES tem um peso muito grande de políticos e de alguns técnicos que não podem ir contra o desejo político de quem os indicou.

A minha sugestão para que quiser tornar o conselho do banco mais técnico é conversar com o Dr. Ozires Silva para ele explicar o que fez quando criou a Embraer Em uma troca de e-mail que tive com o Dr. Ozires Silva, ele escreveu que tinha receio do uso político da Embraer e, assim, convidou para o conselho de administração um grupo de empresários sem vinculo direto com o governo. A Embraer era a única empresas estatal com metade dos membros do Conselho de Administração de pessoas do setor privado.

Como me escreveu o Dr. Ozires Silva, em 2012:

“Desde o início, demos àquela empresa (Embraer) o sentido de uma administração privada, diferentemente de todas as outras empresas estatais que procuraram mais ser Governo do que Empresa. Nosso Conselho de Administração era majoritariamente composto de representantes do setor privado O controle majoritário era do Governo, mas as decisões do Conselho, daquela forma, passavam pelo setor privado.” (correspondência direta com o Dr. Ozires Silva em 2012).

Seria possível algo nesse estilo hoje em uma democracia? O governo tem inclusive um bom exemplo que é o Conselho de Administração da Petro-Sal, no qual nomeou técnicos com experiência.

Eu gostaria ver empresários, como Pedro Passos, Jorge Gerdau, Jorge Paulo Lemann ou economistas como Marcos Lisboa e Claúdio Haddad do INSPER, Carlos Ivan Simonsen e Carlos Lagoni da FGV, ou José Alexandre Scheinkman no Conselho de Administração do BNDES. E por que não algum funcionário aposentado do BNDES? Sim, poderia.

Mas em uma democracia, talvez seja necessário utilizar empresas financeiras e não financeiras públicas para premiar os aliados do partido incumbente. De fato, em alguns casos sim, mas seria bom que não se fizesse isso com os bancos públicos, Petrobras e agências reguladoras. Já há muitos ministérios para acomodar os aliados e, no Brasil, o Presidente da República pode nomear 22 mil cargos contra 2 mil do Presidente dos EUA.

É bom destacar, inclusive, que nomeações políticas para estatais não é um problema apenas do Brasil. O caso da Fannie Mae e Freddie Mac nos EUA mostra como um Conselho de Administração é importante. No caso dessas duas companhias, o Conselho de Administração foi omisso e displicente ao longo da formação da bolha imobiliária.

Em resumo, queremos políticos ou notáveis no Conselho de Administração de nossas estatais financeiras e não financeiras? ou de outra forma, é possível proteger nossas estatais do jogo político de uma democracia?

___________

Votem COISAS INTERNACIONAIS na segunda fase do TOPBLOGS 2013/2014

Comentários

Unknown disse…
Num sistema em que a representatividade é utilizada como moeda de troca, extorsão, seria de um otimismo fantasioso esperar que surgisse um politico que optasse por nomear técnicos em detrimento de políticos, com uma formação péssima por sinal. E se acaso surgisse não teria uma carreira muito longa. Principalmente no Brasil em que paradoxalmente as "relações sociais" estão acima dos interesses da sociedade. De qualquer forma o tema "políticos vs técnicos" é sempre interessante ,mas acho uma perca de tempo continuar apostando que um dia o beija-flor irá apagar o incêndio depois de séculos fazendo o papel dele.

Postagens mais visitadas deste blog

Colômbia – Venezuela: Uma crise previsível

A mais nova crise política da América do Sul está em curso Hugo Chávez o presidente da República Bolivariana da Venezuela determinou o rompimento das relações diplomáticas entre sua nação e a vizinha Colômbia. O fez em discurso transmitido ao vivo pela rede Tele Sur. Ao lado do treinador e ex-jogador argentino Diego Maradona, que ficou ali parado servindo de decoração enquanto Chávez dava a grave noticia uma cena com toques de realismo fantástico, sem dúvidas. Essa decisão estar a ser ensaiada há tempos, por sinal em maio de 2008 seguindo o ataque colombiano ao acampamento das FARC no Equador. Por sinal a atual crise está intimamente ligada aquela uma vez que é um desdobramento natural das acusações de ligação entre a Venezuela e os narco-gueriilheiros das FARC. Nessa quarta-feira o presidente da Colômbia (e de certa maneira o arquiinimigo do chavismo na América do Sul) Álvaro Uribe, por meio de seus representantes na reunião da OEA afirmou que as guerrilhas FARC e ELN estão ativas...

Bye, bye! O Brexit visto por Francisco Seixas da Costa

Francisco Seixas da Costa é diplomata português, de carreira, hoje aposentado ou reformado como dizem em Portugal, com grande experiência sobre os intricados meandros da diplomacia européia, seu estilo de escrita (e não me canso de escrever sobre isso aqui) torna suas análises ainda mais saborosas. Abaixo o autor tece algumas impressões sobre a saída do Reino Unido da União Européia. Concordo com as razões que o autor identifica como raiz da saída britânica longe de embarcar na leitura dominante sua serenidade é alentadora nesses dias de alarmismos e exagero. O original pode ser lido aqui , transcrito com autorização do autor tal qual o original. Bye, bye! Por Francisco Seixas da Costa O Brexit passou. Não vale a pena chorar sobre leite derramado, mas é importante perceber o que ocorreu, porque as razões que motivaram a escolha democrática britânica, sendo próprias e específicas, ligam-se a um "malaise" que se estende muito para além da ilha. E se esse mal-estar ...

Fim da História ou vinte anos de crise? Angústias analíticas em um mundo pandêmico

O exercício da pesquisa acadêmica me ensinou que fazer ciência é conversar com a literatura, e que dessa conversa pode resultar tanto o avanço incremental no entendimento de um aspecto negligenciado pela teoria quanto o abandono de uma trilha teórica quando a realidade não dá suporte empírico as conjecturas, ainda que tenham lógica interna consistente. Sobretudo, a pesquisa é ler, não há alternativas, seja para entender o conceito histórico, ou para determinar as variáveis do seu experimento, pesquisar é ler, é interagir com o que foi lido, é como eu já disse: conversar com a literatura. Hoje, proponho um diálogo, ou pelo menos um início de conversa, que para muitos pode ser inusitado. Edward Carr foi pesquisador e acadêmico no começo do século XX, seu livro Vinte Anos de Crise nos mostra uma leitura muito refinada da realidade internacional que culminou na Segunda Guerra Mundial, editado pela primeira vez, em 1939. É uma mostra que é possível sim fazer boas leituras da história e da...