Hoje a presidente Dilma Roussef abriu a 66ª Assembléia Geral das Nações Unidas – AGNU, foi sua grande estréia no cenário mundial e aconteceu num clima bastante favorável a ela no sentido que recebeu uma boa cobertura da imprensa internacional e tem consolidado uma imagem externa de dura com a corrupção – o que é sempre muito simpático – e por que o Brasil vive um momento econômico interessante e vê reconhecido o aumento de seu poder relativo nos assuntos dessa seara.
Ficou claro o esforço do Itamaraty em marcar o ineditismo de seu discurso, por que seria a primeira vez que uma mulher abriria os trabalhos na ONU, contudo esse esforço não rendeu até o momento os dividendos esperados, em termos de exposição em mídia internacional (ou seja, Soft Power). Essa ênfase se confirma quando se dá conta de que os 4 primeiros parágrafos do discurso enfatizam sua condição de mulher.
É claro, que seria mais relevante, a meu ver se o fato dela ser mulher tivesse sido o que motivou seu discurso, mas a abertura da Assembléia por plenipotenciário brasileiro, ou ministro de estado, ou presidente é tradicional desde a primeira vez que esse órgão se reuniu, ainda nos estertores da Segunda Guerra Mundial, em 1947. Nesse sentido o peso simbólico foi diluído pelo fato de antes dela outras chefas de governo ou de estado por lá estiveram.
A próxima parte do discurso foi dedicada aos temas econômicos em que Dilma tratou do problema da falta de governança global em temas financeiros e a crise de liderança que muitos observadores vêm relatando desde o inicio da crise. E fez uma vaga e protocolar declaração no sentido do tratamento multilateral desses temas pela própria ONU. Do ponto de vista prático o G-20 já apresenta desafios de tomada de decisão enormes. Contudo, a idéia de um mecanismo de consultas de política monetária pode se desenvolver nos meses e anos vindouros.
Dilma com o tradicional “dissociação cognitiva” dos políticos condenou os efeitos nefastos do protecionismo menos de uma semana depois de ter lançado o “Novo Regime Automotivo”. (para saber mais clique aqui).
Dilma como não poderia deixar de ser fez a campanha pela reforma do Conselho de Segurança e demonstrou o compromisso brasileiro com a paz e segurança mundial relembrando a liderança do Brasil na MINUSTAH. O discurso trabalhou pouco esse ponto, talvez por que com a crise econômica e a questão palestina a agenda da reforma do conselho passou ao largo das preocupações dessa AGNU.
Ao entrar na esfera da “Primavera Árabe” o Brasil reforçou o apoio que já havia dado ao reconhecimento da Palestina, de fato o Brasil já faz isso bilateralmente. E arrancou aplausos fáceis e previsíveis ao reafirmar que para o Brasil os limites do Estado Palestino são os pré-1967. Isso produziu um bom “sound byte”, então sem juízo de valor quanto ao reconhecimento foi muito bem engendrada essa parte do discurso pelo redator do Itamaraty.
O pior momento do discurso foi a comparação que a presidente fez entre a convivência de palestinos, árabes e muçulmanos, em geral, com judeus no Brasil com a situação no Oriente Médio.
A comparação é muito usada e abusada, mas ignora que muito mais que entreveros religiosos a questão entre árabes e judeus é política, ou seja, tem natureza, história e condicionantes que se atenuam quando esses são assimilados dentro da cultura brasileira. Embora, seja um importante fator a nos empurrar para o Oriente Médio a presença de descendente aqui e gere simpatia insistir nesse primarismo do aqui eles se dão bem então vamos ensinar os de lá a viverem como aqui é além de inócuo um tanto constrangedor.
Dilma toca também na questão das intervenções humanitárias, como escreveu meu colega Mauricio Santoro, professor da FGV, em seu blog:
[Dilma] Condenou as doutrinas em voga na OTAN ao destacar que além de falar em “responsibilidade de proteger” (R2P) é preciso tratar da “responsabilidade ao proteger”, isto é, como são executadas as chamadas intervenções humanitárias. E defendeu, uma vez mais, a reforma no Conselho de Segurança da ONU.
Essa condenação se coaduna com a linha geral do Itamaraty, que desconfia de qualquer relativização da soberania estatal. Essa linha pragmática, diga-se de passagem, encontra muito eco entre os que se arrogam ser “antiimperialistas”.
Em linhas gerais foi uma estréia positiva para a presidente, mas o discurso é só parte do que é participar da AGNU sua agenda de encontros reservados e bilaterais também é importante e pretendo avaliar em outra oportunidade esse aspecto.
O discurso foi condizente com a história da diplomacia brasileira na ONU. Feito com frases curtas, quase como se feito para ser comentado no Twiiter, a presidente o leu de maneira satisfatória, embora pudesse ter feito pausas mais pronunciadas. A presidente lidou bem o discurso, mesmo não tendo muito carisma com seus dois predecessores mais imediatos.
Sobre a Dilma e qualquer mulher em posição de liderança recai um peso extra que me parece um tanto cruel, mas que deve ser lidado que é a questão estética e de vestimenta. É extra no sentido que mesmo que para os homens a escolha do traje seja importante para passar a imagem correta é preciso ser o Kadafi para que suas roupas sejam noticias já no caso das mulheres o mínimo deslize nas roupas, acessórios ou maquiagem pode lhe render chacotas (incrivelmente por parte de outras mulheres) por meses. E nessa esfera considero que a presidente escolheu roupas, acessórios e maquiagem adequados e bonitos no final das contas.
E vocês o que acharam do “histórico” (pobre palavra tão abusada) discurso da Dilma, na AGNU?
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