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Honduras: Eleição e tensão

Amanhã (domingo 29/11) teremos as eleições hondurenhas, que estavam marcadas é preciso lembrar, desde antes da deposição de Manuel “mel” Zelaya. Aqui nesse blog já deixei explicito em inúmeras oportunidades que considerava a saída eleitoral a mais satisfatória das saídas possíveis para crise. Por dois principais motivos defendi essa linha de pensamento: a) por recobrar a normalidade institucional; b) por respeitar a soberania popular em conformidade com as normas vigentes.

As condições para que essas eleições alcancem esses enunciados acima se pautam na liberdade e lisura do pleito e nesse quesito uma participação pragmática da OEA corroboraria muito a causa da democracia do continente. Não por contemporizar com a forma como se deu a deposição de Zelaya, que embora prevista em lei, foi sem dúvida feita de maneira desastrada.

A posição de parte da América Latina de se concentrar exclusivamente na restituição de “mel” sem considerar os fatores institucionais e conjunturais hondurenhos, foi justificada em nome da defesa da democracia, contudo, tem ficado cada vez mais patente, como discuti em textos anteriores, que foi um alinhamento ideológico, sustento essa afirmação com o conceito que criei de moralidade ad hoc pra descrever a incongruência de políticas externas ativistas em prol da “democracia” serem levadas a cabo por nações que defendem ativamente regimes totalitários. Ou seja, a democracia não é o valor que norteia esse ativismo e sim se a liderança de determinado Estado comunga dos princípios propalados pela Esquerda Latina.

É preciso não confundir ativismo diplomático com diplomacia ativa. A primeira é uma forma de atividade política que se baseia em valores e ideologias, mesmo que a despeito do interesse nacional. A segunda por sua vez é uma política externa que busca de maneira vigorosa os interesses nacionais, sendo por natureza pragmática, já que a busca do interesse nacional não pode sofrer constrangimentos por motivos ideológicos.

Voltando ao tema a preocupação nessas horas que antecedem o pleito é que grupos políticos mais preocupados com suas agendas de poder do que com a democracia hajam de maneira violenta e desordeira pra colocar ainda mais sobre suspeição o pleito, ou para intimidar a população e forçar um índice de não comparecimento tal que esvazie de legitimidade o certame eleitoral.

Há, obviamente, a preocupação de que se em caso de irrupção de algum protesto mais agudo as forças de segurança reajam de maneira exarcebada, o que incitaria, com justiça, a população, o que pode terminar em cenas trágicas de violência.

Em caso das projeções eleitorais se confirmem e o candidato rotulado como de direita vença, esse terá um cenário difícil para conduzir as relações internacionais de seu país, já que contaria (mesmo se houvesse a deposição) uma oposição fortíssima dos países da ALBA.

Uma previsão (se é que podemos chamar uma constatação óbvia) que foi feita nesse espaço que se confirmou é que a crise só seria superada, ainda que parcialmente, com a entrada em cena do Departamento de Estado. Não só pelo enorme peso político dos EUA, mas por seu peso nas receitas hondurenhas, seja na forma da assistência econômica e militar, seja por meio das remessas de migrantes hondurenhos nos EUA.

A tal propalada unanimidade da sempre não definida “comunidade internacional” em condenar o suposto golpe em Honduras, já foi corroída com a posição americana de apoio que encontrou ressonância, na Colômbia, Peru, Costa Rica, entre outros países da região.

Resta a difícil questão. Aceitar um golpe de Estado na região é sem duvida um retrocesso, contudo como classificar a não-aceitação ou não-reconhecimento de um governo oriundo da vontade popular, eleito constitucionalmente?

Esperemos agora os desenvolvimentos para começar a vislumbrar como as forças políticas internas de Honduras e atores regionais comportar-se-ão.

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