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O complicado caminho até a Casa Branca




O processo eleitoral americano é longo e complexo, sua principal característica é a existência do Colégio Eleitoral, que atribui aos candidatos uma quantidade de votos, que equivale ao número de senadores ou deputados (lá chamados de representantes) que cada estado tem direito no Congresso dos EUA.

Esse sistema indireto de votação é uma fórmula constitucional enraizada no processo histórico da formação dos Estados Unidos, que buscava em um forte federalismo, criar mecanismos que pudessem minorar ou eliminar a possiblidade de um governo tirânico. Esse arranjo federalista se manifesta fortemente, também, na forma como a Constituição Americana é emendada, sendo necessário a ratificação de uma emenda aprovada no congresso pelos legislativos estaduais.

São 538 votos totais no Colégio Eleitoral, a Califórnia tem o maior número de votos, com 55 e o Distrito de Columbia (equivalente ao nosso Distrito Federal) e outros 7 estados com 3 votos têm a menor quantidade, o censo populacional é usado para compor a distribuição dos representantes entre os estados e, portanto mudanças demográficas, alteram essa proporção ao longo do tempo. O número necessário para eleger um presidente americano no Colégio Eleitoral são 270 votos, caso nenhum candidato consiga esse número, a câmara dos representantes escolhe o vencedor entre os três mais votados.

Dos cinquenta estados americanos, apenas dois (Nebraska e Maine), distribuem seus votos no colégio eleitoral, a partir da proporção dos votos populares em suas jurisdições. O resto funciona com o vencedor leva tudo, grosso modo, como os sets de uma partida de vôlei, uma vitória acachapante de 25 a 0, te dá o mesmo ponto de um emocionado e disputado set de 25 a 23.

As preferências dos eleitores nos estados são mutáveis ao longo do tempo e estados que tradicionalmente apoiam um partido, podem trocar de lado ao longo de várias eleições. Há estados, contudo, que são costumeiros na troca de lado, os chamados estados pendulares, e acabam por ser decisivos nos cálculos políticos dos partidos, porque recebem mais recursos para propaganda e maior tempo no solo dos candidatos. Por isso, comentaristas e jornalistas focam a atenção do noticiário para lugares como Michigan, Flórida e nesse ano até o Texas, que era firmemente republicano.

Muito tem se falado se esse sistema estaria divorciado da vontade popular ao estabelecer métodos de mediação dessa vontade. Contudo, a observação histórica mostra que foram poucos os casos de que o vitorioso no colégio eleitoral não tenha sido, também, o preferido no voto popular. O sistema eleitoral americano tem muito que evoluir no campo dos Estados, sobretudo, em questões importantes como estratégias de supressão eleitoral, ou seja, criar leis locais que dificultam o registro eleitoral e o voto de grupos opositores e apuração e contagem dos votos. Contudo, experiências como voto antecipado e voto pelo correio são expedientes dignos de observação e até mesmo cópia, como incentivadores do voto ao tornar o processo mais fácil e conveniente para o eleitor.

O Colégio Eleitoral é um caminho tortuoso e complicado para escolher presidentes, mas talvez o fato de que esse sistema serve de freio para a ideia de que apoio das massas coloca o executivo acima das leis, ideia essa que seduz tantos políticos para o autoritarismo e voluntarismo, seja benefício suficiente para fazer valer a pena o fato do sistema impor ao eleitor americano navegar por cálculos infindáveis e enfrentar as contradições no tecido social de seus estados a cada quatro anos. 

Comentários

Unknown disse…
meus parabéns pelo artigo!! extremamente bem escrito

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