O discurso de abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas é um privilégio brasileiro desde a fundação da ONU (o porquê disso é uma excelente história, se você não sabe, pesquise) e mais uma vez a presidente Dilma foi a ONU aproveitar o maior palco político planetário. Ano passado havia uma expectativa sobre o discurso da mandatária brasileira que se dava em meio ao escândalo da revelação da massiva – e abusiva – máquina de espionagem global da NSA. Esse ano a atenção, contudo, não foi a mesma.
Comparada a estréia Dilma já se mostra mais a vontade nesse tipo de discurso, o conteúdo do discurso deixou claro o desprezo da presidente quanto aos assuntos externos e o papel secundário dado ao Itamaraty. Nenhum diplomata profissional permitiria que se trate crises diferentes como Rússia e Ucrânia e combate ao ISIS num só ‘balaio’.
Dilma insistiu no velho discurso da reforma do Conselho de Segurança e da governança global, sem demonstrar liderança efetiva nesse sentido. Não concordo com a meta de Cadeira no Conselho de Segurança, mas se esse é um objetivo, só será alcançado quando o Brasil já for de fato um ator relevante em assuntos de defesa e assim poderá requisitar que seja também ator de direito.
Já gastei muitos e muitos bytes explicando minha objeção a Cadeira no Conselho de Segurança, o elemento central do meu argumento é que esse tipo de posição exige um preço alto em tesouro e sangue de nossos jovens, que não é devidamente comunicado a sociedade brasileira.
Um peculiar pacifismo no atacado surgiu no discurso da presidente:
“Não temos sido capazes de resolver velhos contenciosos nem de impedir novas ameaças. O uso da força é incapaz de eliminar as causas profundas dos conflitos. Isso está claro na persistência da questão Palestina, no massacre sistemático do povo sírio, na trágica desestruturação nacional do Iraque, na grave insegurança na Líbia, nos conflitos no Sahel e nos embates na Ucrânia. A cada intervenção militar não caminhamos para a paz mas, sim, assistimos ao acirramento desses conflitos.”
A preocupação com soluções pacíficas é sim algo importante e historicamente o sustentáculo da Política Externa Brasileira, principalmente no relacionamento com os vizinhos. E igualmente nobre e sensato é a posição de preocupação com as populações civis afetadas, mas expressar isso sem um plano de ação, ainda que limitado pelas condições brasileiras, são palavras ao vento.
A noção de solução negociada com o ISIS parece ser contrariada pelos relatos dos que fogem das áreas conquistadas pelo Estado Islâmico e nesse particular as lindas palavras de Dilma nos lembra o pacifismo desmedido de Neville Chamberlain.
Foi um discurso proferido em meio a uma amarga campanha pela reeleição e isso se fez sentir, mas o que restou claro é que a presidente não tem apreço (nem conhecimento) pelas questões externas, nem pelos diplomatas. O discurso demonstrou, também, uma desconexão com a realidade das coisas internacionais.
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