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Venezuela: Comissão de Chanceleres, agora vai?

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O horizonte próximo não parece muito favorável ao diálogo e a normalização da política venezuelana, isso por que a oposição nas ruas e no sistema político não tem esmorecido diante das táticas de alta pressão do regime bolivariano, nem a destituição de Maria Corina Machado nem as condenações, em tempo recorde para os padrões continentais, de líderes da oposição surtiram o efeito, por outro lado a pressão das ruas também não é capaz de mover o regime na direção que os opositores desejam, ou seja, a pressão não tem conseguido que o regime desista de processar e manter presos opositores ou que substitua os ministros do Tribunal Superior de Justiça, Conselho Nacional Eleitoral.

O impasse tem servido para polarizar ainda mais a Venezuela e o risca cada vez mais real é que se rompa com qualquer chance de restauração dos padrões mínimos de convivência política, em outras palavras, o pior cenário possível é que a crise culmine num conflito armado. Claro, que para isso acontecer é preciso uma “tempestade perfeita”, mas ainda assim a violência das milícias chavistas e as divisões nas Forças Armadas da Venezuela nos lembram que esse cenário não pode ser descartado.

A UNASUR enviou ontem sua missão para facilitar o diálogo entre as partes, que é composta pelos chanceleres de Brasil, Colômbia e Equador. Desde que o impasse ficou claro, eu tenho insistido que os Bons Ofícios dos vizinhos são essenciais para que se alcance um diálogo efetivo que poupe vidas e que poupe a Venezuela de um recrudescimento do chavismo ou de uma ruptura institucional traumática.

Mas, como tenho escrito aqui – e outros analistas e observadores, também – para que a intermediação seja eficiente em facilitar o acordo seria preciso o mínimo de neutralidade (se é que exista graduações de neutralidade) por parte dos facilitadores externos.

E a postura brasileira (mais Planalto que Itamaraty) tem sido de usar a cobertura do principio de ‘não-intervenção’ sempre que se cobre uma postura sobre os abusos praticados pelo governo venezuelano e o boicote aos oposicionistas como vimos na manobra brasileira para impedir a publicidade na fala de Maria Corina na OEA demonstram uma inclinação da diplomacia brasileira pelo lado do regime. Poder-se-ia argumentar que isso deriva de uma visão brasileira em prol dos governos eleitos como entes legítimos, mas fosse esse o caso o Brasil não faria tanta questão de ser neutro (ao negar afirmar que se trata de um grupo narco-terrorista) diante da FARC.

Isso significa que a missão tem uma dificuldade patente de cumprir sua missão de facilitar o diálogo e pior pode ser usada como endosso para a radicalização oficial ou opositora.

Até agora a Comissão de Chanceleres da UNASUR não pediu pela libertação dos detidos e um recuo na busca por condenações dos líderes da oposição que é para oposição condição sine qua non para a negociação. Os ministros conseguiram que Maduro se reúna com os opositores. Um sinal interessante se for seguido de passos concretos na direção da pacificação política, ou será apenas outra Conferência Nacional para a Paz. E a UNASUR pode acabar assistindo a mediação da Santa Sé ser mais efetiva, por que consegue ser considerada neutra.

E o impasse vai se arrastando e os ânimos vão se exaltando. E os atos de violência política e comum continuam a ocorrer.

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