Todos nós que já estivemos em missões internacionais já passamos por situações como a que descreve o embaixador português Francisco Seixas da Costa. São ‘saias-justas’ que decorrido tempo suficiente se tornam anedotas interessantes e divertidas do dia-a-dia dos que se dedicam as coisas internacionais. Ainda lembro da insistência da Professora Leila Bijos para que tivéssemos SEMPRE a postura que o diplomata relata quando participamos de nossa primeira missão acadêmica ao exterior, mesmo diante de pernas de rã (que por sinal estavam ótimas). Lições úteis até hoje professora.
Educação diplomática
Por Francisco Seixas da Costa
O "jet lag" não ajudava nada. Naquele primeiro dia em Seul, mais do que seguir o calendário de eventos daquele seminário, eu morria de cansaço. Mas o "dever" chamava-me: cabia-me co-presidir a um exercício que pretendia retirar, da experiência da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, lições para a gestão das tensões na península da Coreia. Coordenava uma delegação multinacional ida de Viena, tendo como meu contraparte o secretário de Estado coreano dos Negócios Estrangeiros, velho amigo de outros postos.
O programa de uma das noites incluía assistir uma peça de teatro coreano, a que se seguia um jantar num restaurante típico. Estafado como estava, passei "pelas brasas" no espetáculo, aproveitando a redução das luzes. Chegados ao restaurante, um espaço tradicional, percebi que nos íamos sentar "à coreana", em almofadas e com as pernas cruzadas sob uma mesa baixa, o que iria pôr à prova os meus sacrificados joelhos. Mas, pronto!, era serviço!
Por feitio, não sou muito dado a experiências gastronómicas radicais e, muito em especial, sou habitualmente avesso a culinárias étnicas. Por isso, à vista dos pratos locais, fui fazendo uma seleção criteriosa sobre aquilo que neles me apetecia comer. Até que chegou o prato principal. Nunca consigo recordar o que era; só sei que era algo "sinistro", pelo cheiro e pela prova. Com alguma arte, fui afastando a comida pelo prato, enquanto alimentava a conversa com o meu contraparte, sentado à minha frente. A certo passo, notando que eu já não comia e muito do que fora servido já estava disperso, o anfitrião coreano perguntou, preocupado:
- Não gosta da comida?
Senti-me culpado pelo facto de não estar a corresponder à sua gentileza, pelo que me saiu qualquer coisa como isto:
- De forma nenhuma! Estava muito bom! Gostei imenso, mas já acabei.
O que eu fui dizer! O meu amigo coreano, temeroso que eu não tivesse ficado saciado, e apoiado no meu pronto elogio à sua comida nacional, logo mandou vir para mim uma nova dose, idêntica àquela que eu tinha dispersado com tanto cuidado pelo prato. E lá tive eu que comer aquela mistela, desta vez com escassa capacidade de disfarce. Foi uma noite bem penosa, confesso! A educação diplomática, às vezes, tem um elevado preço.
Comentários
Fiquei contente com a inserção do artigo do Embaixador Seixas Corrêa, e também de seu comentário sobre a sua experiência em um lindo e aprazível país latino-americano.
Recentemente fui entrevistada pela equipe da Embaixada Britânica a respeito da Diplomacia Cultural e incluí alguns comentários sobre a minha experiência e de meus alunos.
Desejo ressaltar que você se portou muito bem nessa missão, e tenho certeza que continua com os cuidados de sempre com a diplomacia cultural, incluindo a diplomacia gastronômica.
Abraços,
Profa. Dra. Leila Bijos