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Brasil e Venezuela: uma advertência de Pessoa

Maria machado

Fernando Pessoa escreveu que todas as cartas de amor são ridículas, por que não fossem ridículas não seriam cartas de amor e algo muito parecido pode ser dito sobre o autoritarismo, ele é ridículo. Mas, não é por ser ridículo que o autoritarismo não é perigoso. Seja o autoritarismo coletivista dos revolucionários comunistas ou obsessão com ordem e nacionalismo dos regimes militares, todo autoritário é violento por natureza.

Maria Corina Machado – não tenho qualquer relação de parentesco, apesar do nome parecer – deputada mais votada da atual legislatura venezuelana, eleita pela Mesa de Unidad Democrática, MUD, partido de oposição ao regime chavista foi sumariamente cassada.

Qual delito ou falta administrativa grave levou a perda do mandato da deputada venezuelana? Bom, ela foi até OEA denunciar a repressão violenta do regime que ela chama de “castro-chavista”. E aparentemente isso é dá causa para a curiosa interpretação legal abaixo, do presidente do Parlamento Diosdado Cabello:

“Estando allá (en la OEA) hubo declaraciones, acciones, peticiones, de la señora María Machado como funcionaria del gobierno panameño. Eso es público, notorio y comunicacional, de hecho y de derecho, cuando ella actuaba estaba aceptando cualquier cargo que le estaba dando el gobierno panameño”.

Em entrevista ao El País, reagiu assim a deputada:

"Sou María Corina Machado, sou e continuarei sendo deputada pela Assembleia Nacional da Venezuela. Conheço bem meus deveres e meus direitos e seguirei lutando e trabalhando como deputada nestas horas terríveis de repressão na Venezuela. O senhor Cabello deveria ler a Constituição e o regulamento da Assembleia. A diretiva da Assembleia não tem atribuições para destituir, só se pode ser destituído por morte, renúncia, sentença firme ou por uma revogação, e evidentemente este não é o caso”

Diosdado Cabello além de presidente da Assembléia Nacional da Venezuela é apresentador de televisão, escrevi sobre ele dia 17 de fevereiro:

“Um símbolo dos ânimos acirrados e da violência do discurso político do regime bolivariano é o programa de TV do Presidente do Parlamento da Venezuela, Diosdado Cabello, que tem o elegante nome de “Con el mazo dando” algo como “descendo o porrete” e que tem como logo um simpático porrete com pregos.”

Que um regime como o bolivariano que enfrenta um protesto tão vigoroso nas ruas e um real desafio nas urnas se valha desse tipo de expediente para reforçar a pressão nos adversários e ao mesmo reforçar a narrativa que tenta difundir que forças externas (Washington) estão a frente dos protestos não surpreende, aliás, é bem previsível. O que causa uma reação forte, que eu queria que fosse estranheza, são os três últimos parágrafos da nota da Agencia Venezolana de Noticias – AVN:

“El viernes pasado, en la sede de la OEA, María Corina Machado recibió el rechazo del organismo hemisférico, que decidió no hacer pública su intervención en la Sesión Ordinaria del Consejo Permanente.

En un acostumbrado debate sobre las reuniones de la OEA, Nicaragua propuso desarrollar a puerta cerrada la reunión, propuesta que recibió el respaldo de 22 embajadores de los Estados miembros, mientras que 11 manifestaron estar en contra y uno expresó su abstención.

Tras la votación, el representante de Brasil, Breno Dias da Costa -quien votó a favor de que la reunión fuera privada- dijo que esta decisión no buscó "impedir un diálogo, sino impedir un 'show' para una platea externa", reseñaron agencias internacionales.”

É essa uma diretriz de nossa Política Externa, recusar ouvir um depoimento por que é um “show” pra “platéia externa”? E o que seria platéia Externa, para o Itamaraty? São os meios de comunicação de massa?

Eu entendo o valor de uma reunião a portas fechadas para que se possa negociar com alguma flexibilidade, mas para ouvir testemunhos? Como defender uma posição dessas se coaduna com o esforço de diplomacia pública e aberta que o Livro Branco, em gestação, representa?

Fernando Pessoa, ou melhor, seu heterônimo Álvaro de Campos escreveu que:

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente Ridículas.)

Não consigo conceber nada mais esdrúxulo que defender almas totalitárias e ainda facilitar o seu proceder e se a igualdade proposta pelo poeta é verdadeira, a diplomacia que nos representa é igualmente ridícula. Ou melhor, conhecendo sua história e muitos dos seus “fazedores” devo dizer que ela apenas está ridícula, mas como diz a música popular “vai passar”...

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