Não compreendo o fenômeno do rolezinho em sua integralidade, mas tenho visto uma clara tentativa de transformar esse flash mob numa grande questão cultural e política.
Exagero meu? Então leia essa matéria da Folha de São Paulo, em que o universitário de Brasília tem sonhos dourados de revolução anti-capitalista, como ele diz: “O alvo [do rolezinho] não é o Estado, é a iniciativa privada”. (Falho em compreender como um movimento animado pelo Funk Ostentação, pode ser contra a iniciativa privada.)
É interessante contrastar a visão do jovem universitário brasiliense com a de um participante dos rolezinhos, ouvido pelo IG que diz: “Protesto? Rolezinho é para pegar mulher” e continua “Eu não concordo com quem vai para arrastar e roubar. Isso é coisa de trombadinha. Eu tive amigos que me deixaram sozinho para ir roubar, dizendo 'ah, se tá todo mundo arrastando, vamos arrastar também”.
Claro, que os ativos hormônios da adolescência podem afetar a capacidade de análise crítica do jovem paulistano, mas seu hedonismo pueril é um fator que não pode ser excluído das análises sobre o rolezinho, aliás, lembrei de uma crônica da blogueira cubana Yoani Sánchez.
Os filhos devoram Saturno
Esses jovens que vejo hoje, ensimesmados nos seus MP3 e com a calça abaixo da cintura, anseiam – como nós já ansiamos – pelo momento de estar “no comando da casa” e trocar os móveis, renovar a pintura e convidar os amigos. Eles têm a mesma aversão ao que é herdado e o mesmo deleite com o proibido que todos os que já passamos por essa idade também tivemos. Não vão seguir o caminho que os mais velhos traçaram e – por sorte – não se encaixam de jeito nenhum no ideal do “homem novo”.
Gosto da maneira como fazem de conta que nada lhes interessa, quando na realidade aguardam o momento de tomar o microfone e brandir a caneta e levantar o indicador. Eu os observo e não posso imaginar esses garotos que hoje se mexem ao ritmo do reggaeton justando o seu passo a uma marcha militar. Também não consigo percebe-los hipnotizados por um líder, se deixando levar e se sacrificando por ele. O hedonismo os salva da entrega incondicional e certo toque de frivolidade os protege contra a sobriedade das ideologias.
Parafraseando o poeta Eliseo Diego, esses simpáticos jovens têm “o tempo, todo o tempo”. Assim, de momento eles deixam que os mais velhos acreditem nos seus compromissos de continuidade e conservação. Mas vai chegar o dia de trocar – inclusive – a fechadura da casa.
SÁNCHEZ, Yoani. De Cuba com carinho. Ed. Contexto, pp 157-158.
Nesse fenômeno todo, que mobilizou até ministros de estado, me recuso a esquecer que esses jovens são indivíduos de todas as naturezas e todo tipo de valores morais, são indivíduos agrupados, mas nem por isso são coletivos como “pobres”, “excluídos”, “vitimas de racismo” e por ai vai.
Gosto do tão menosprezado hedonismo e consumismo deles, ainda que leve a comportamentos fúteis, compartilho com Yoani a esperança que esse comportamento, que os “politizados de plantão” chamam de alienação os salvem de se tornarem massa de manobra e possam livres de coletivizações acharem seus caminhos na vida.
Comentários