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Dilma em Davos: preocupante

dilmadavos A presidente Dilma, finalmente, estreou no palco de Davos e participou do famoso (ou infame, a depender do jeito que você vê o mundo) Fórum Econômico Mundial, que anualmente invade a pacata cidade suíça e a transforma no centro do mundo.

A ida de Dilma a essa edição do Fórum Econômico Mundial foi motivada por duas necessidades urgentes da administração petista. Acalmar os investidores estrangeiros e tentar se distanciar da inconsistência regulatória (e das políticas erráticas de câmbio) de parceiros de MERCOSUL.

A desconfiança do mercado é alimentada pelas pressões inflacionárias e cambiais sobre o Real, como nos mostra reportagem do El País:

“[..]Nesta quinta-feira, o jornal Financial Times destacou que ativos de estrangeiros no Brasil (capital direto e de curto prazo) perderam valor equivalente a 285 bilhões de dólares nos últimos três anos em função da variação cambial, principalmente. Fatores como esse vêm aumentando o time de investidores internacionais céticos.”

Por isso o discurso da presidente Dilma se ocupou tanto de demonstrar a pujança do mercado interno e resgatou os números do crescimento da classe média, elencando os produtos que apresentam demanda reprimida, transcrevo os trechos (retirados da página oficial do Palácio do Planalto):

“O Brasil, por sua vez, vem experimentando uma profunda transformação social nos últimos anos. Estamos nos tornando, por meio de um processo acelerado de ascensão social, uma nação dominantemente de classe média. Alguns números ilustram essa realidade: os 36 milhões de homens e mulheres que foram tirados da extrema pobreza recentemente; os 42 milhões que ascenderam à classe média, que passou de 37% da população para 55% da população, apenas entre os anos a partir de 2003 até hoje. A renda per capita mediana das famílias brasileiras cresceu 78% no mesmo período. Nos últimos três anos, nós geramos 4,5 milhões de novos empregos.

Criamos um grande mercado interno de consumo de massas. Somos hoje um dos maiores mercados para automóveis, computadores, celulares, refrigeradores, fármacos e cosméticos. Mas apenas 47% dos domicílios têm computador; 55% apenas possuem máquinas de lavar roupa automática; 17%, freezer; 8% TV plana, evidenciando o tamanho da demanda ainda a ser atendida e as oportunidades de negócios a ela associadas.”.

Os áulicos da administração Dilma têm sido muito combativos quanto aos hábitos da classe média e até mesmo hostis, como podemos ver nas declarações de ministros e de membros da cúpula do partido no poder, então é interessante notar que a presidente ostenta (pra usar palavra da moda) a classe média quando fala ao mundo.

Esse trecho do discurso é voltado para tentar atrair os investidores de risco, isto é, aqueles que fazem investimentos produtivos, afinal é um mercado interessante com potencial de expansão, contudo a competição por esses investimentos está acirrada e sem a confiança na manutenção das regras do jogo e dos indicadores macroeconômicos é difícil que vejamos uma nova enxurrada de investimentos diretos, ainda mais com a recuperação das economias mais avançadas.

Continua a presidente agora falando sobre a inflação:

“Quero enfatizar que nós não transigimos com a inflação. A responsabilidade fiscal, por sua vez, é um princípio basilar da nossa visão de desenvolvimento econômico e social. No Brasil, as despesas correntes do governo federal estão sob controle e houve uma melhora qualitativa das contas públicas nos últimos anos. Conseguimos acentuada redução da dívida líquida do setor público, que caiu de 42,1%, em 2009, no início da crise, para 34% do PIB, em 2013. Mesmo a dívida bruta declinou neste mesmo período, passando de 60,9% para 58,5% do PIB.”

A questão da dívida pública é bem complicada, mas nossa situação não é assim tão confortável como quer parecer a presidente e comparativamente nosso endividamento é maior que a média dos países latinos. (ver aqui). Para quem se interessar mais sobre como é o estado atual do endividamento brasileiro recomendo uma passadinha pelas verdes paragens do blog do Mansueto, que com muito didatismo e informação faz um retrato da situação.

Ainda tratando de mostrar as pontecialidades brasileiras e tentar recuperar o status de queridinho que o Brasil da era Lula dispunha junto aos investidores, Dilma falou do seu programa de privatizações, é claro, fugindo de assim o chamar, por alienaria demais a própria base.

“Temos, em parceria com o setor privado, um programa de concessões em infraestrutura logística integrada, infraestrutura energética, social, infraestrutura urbana, que envolve centenas de bilhões de dólares. O objetivo é somar recursos, mas é também aumentar a eficiência e aperfeiçoar a gestão dos serviços associados a essas obras. Os consórcios privados, que vêm participando desse processo de concessões e licitações, são integrados por grandes empresas nacionais e internacionais.

Realizamos cinco leilões de rodovias, transferindo, já, mais de quatro mil quilômetros para a gestão privada. Fizemos concessões de seis grandes aeroportos para consórcios liderados por grandes operadoras internacionais, e obtivemos outorgas de US$ 20 bilhões, desses aeroportos, e obteremos, ao longo dos contratos.

Adotamos um novo marco regulatório para o sistema portuário, permitindo a ampliação da participação privada na oferta dos serviços portuários, com critérios de eficiência e aumento do volume de carga. Foram autorizados, já, oito portos privados, com investimentos de mais de US$ 1,5 bilhão. Em 2014, autorizaremos novos terminais privados e iniciaremos os arrendamentos em portos públicos.”

Toda essa linha de argumentação usada pelo governo já vinda sendo testada pelo ministro Mantega e pelo presidente do BACEN Tombini. Contudo, a falta de algo concreto para apresentar para os investidores não passou em brancas nuvens como nos mostra essa reportagem da Reuters:

The world's largest bond fund manager, Pacific Investment Management Co, known as Pimco, expressed concern about Brazil's deteriorating public finances in an investor note on Thursday.

"The policy mix that has eroded confidence, distorted the local interest rate market, undermined the currency and injected credit risk premium into sovereign assets is readily fixable," wrote Michael Gomez, co-head of Pimco's emerging markets portfolio team. "Things could improve from here, if policymakers rethink their remedies for Brazil's challenges."

Antes que me acusem de pessimismo e me mandem, por e-mail, mais dados é preciso deixar claro que a situação da economia brasileira é preocupante, mas não alarmante, não nos dirigimos para um precipício, mas se nada for feito podemos parar num atoleiro de constante baixo crescimento, ou pior com anos de nenhum crescimento. Ademais, os gastos da Copa do Mundo, vão complicar ainda mais o cenário inflacionário o que obrigará uma subida de juros, que prejudica o governo encarecendo a dívida, enfim preocupante é a palavra.

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