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Ex-Ministro Patriota visto por Francisco Seixas da Costa

O diplomata português Francisco Seixas da Costa que foi Chefe de Missão da embaixada portuguesa, em Brasília e em Paris possui uma escrita agradável e que demonstra, sem afetações, a elevada erudição do autor. No texto que transcrevo abaixo (com autorização do autor, é bom salientar) o embaixador mais uma vez nos permite um olhar no viver diplomático e dá conta de suas impressões a cerca de Antônio Patriota.

É sempre enriquecedor ler o diplomata português, o texto segue em sua originalidade, incluindo a grafia lusitana do nome do ex-chanceler. Aqui link para o original, no excelente blog Duas ou três coisas.

António Patriota

Por Francisco Seixas da Costa

Patriota 

António Patriota deixa o cargo de ministro das Relações Exteriores do Brasil para ir chefiar a missão brasileira junto das Nações Unidas. Patriota é um excelente profissional, com uma imensa experiência e, devo dizer, sinto pena ao vê-lo deixar a chefia do Itamaraty. Ainda há pouco tempo tive o gosto de conversar com ele em Lisboa e confirmar o seu empenhamento no aprofundamento das relações luso-brasileiras.

Fizemos uma boa amizade no tempo em que coincidimos no Brasil e, creio, ambos contribuímos, cada um à sua maneira, para um período interessante da nossa relação bilateral. Por essa altura, o António desempenhava o importante lugar de diretor-geral político do Itamaraty e eu era embaixador de Portugal.

Um episódio curioso envolveu-nos aos dois, por esse tempo. O ministro brasileiro das Relações exterioras, Celso Amorim, havia decidido pôr termo à missão em Lisboa do embaixador António Paes de Andrade, um "embaixador político" que ocupava esse cargo, desde há alguns anos. Nas vésperas da decisão ser tomada, o governo brasileiro, num gesto elegante, havia decidido informar-nos, através de uma conversa que o então secretário-geral do ministério das Relações exteriores (que é o substituto do ministro), embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, quis ter comigo, do nome do sucessor de Paes de Andrade. Pela regras normais da diplomacia, deveria ser este a pedir, em Lisboa e junto das Necessidades, o "agrément" para o seu sucessor. Ora António Paes de Andrade - e só conto isto porque tudo veio publicado na imprensa brasileira da época - terá eventualmente reagido mal à decisão da sua substituição, recusando-se a solicitar às nossas autoridades a acreditação para o novo embaixador.

(Para quem não saiba, a regra dos pedidos de "agrément" é que o embaixador cessante faça a entrega, junto do chefe do Protocolo do país onde está acreditado, de um currículo da pessoa que o seu governo pretende nomear para seu sucessor, numa folha de papel branco, não timbrada. Pela tradição, se o nome for recusado (o que acontece raramente, sendo um longo "silêncio" do Estado recetor a demonstração implícita de que o nome não vai ser aceite), não restará qualquer prova material do pedido. Isto era assim no passado. Nos dias que correm, muitos Estados já não procedem da mesma forma e os currículos até já seguem, em muitos casos, em anexo a uma simples nota rubricada...)

As autoridades brasileiras terão ficado numa situação algo embaraçosa. Como podiam formular o pedido de acreditação para o sucessor de Paes de Andrade, face à recusa deste em executar a instrição? Só havia uma maneira: utilizar a embaixada portuguesa em Brasília. Assim, dois dias mais tarde, António Patriota, como diretor-geral político, pediu para eu ir vê-lo. Durante vários minutos, a nossa conversa tocou vários assuntos, sem aparente objetivo concreto. A certo passo, porém, disse-me:

- Francisco, você sabe que vamos mudar o embaixador em Lisboa?

Respondi-lhe que sim, que, simpaticamente, já fora informado pelo secretário-geral, e que até conhecia bem o futuro embaixador, de quem era amigo, desde o meu anterior tempo de Viena.

- E você tem o currículo dele?, inquiriu António Patriota, estendendo-me uma folha sem timbre, com o percurso profissional do diplomata.

Agradeci a "informação" e, minutos depois, regressei à embaixada. Transmiti então a Lisboa o pedido de "agrément" formulado pelas autoridades brasileiras. Mas a conversa com Patriota configurava algum pedido? Na realidade, nada me tinha sido solicitado, a palavra acreditação não fora sequer pronunciada, formalmente a nossa conversa não podia mesmo ser qualificada de uma "démarche" ou diligência. Mas, para bom entendedor, o gesto "florentino" de diplomacia de António Patriota era muito claro. E, três dias depois, o sucessor de Paes de Andrade recebia o beneplácito das autoridades portuguesas - uma rara rapidez, no nosso caso consonante com a excelência das relações que sempre pretendemos manter com Brasília.

Um forte abraço, António. Boa sorte para Nova Iorque! Quando passar por Portugal, os seus amigos aqui estarão à sua espera.

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