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Reflexões sobre agricultura e cultura indígena, por Daniela Missio

A questão abordada por Daniela Missio nessa reflexão é polêmica e o texto nos oferece elementos para construir uma opinião verdadeiramente ponderada sobre a temática.

Reflexões sobre agricultura e cultura indígena

Daniela Missio

Agricultura e cultura indígena não são questões contraditórias, nunca foram, muito pelo contrário. Apoiar agricultores não subentende desamparar índios; da mesma maneira que ser a favor da preservação da cultura indígena não sugere ser contra a agricultura, nem familiar, nem profissionalizada. A questão indígena x terras no Brasil é polemica, e tem que ser debatida muito mais com conhecimento de causa do que através de ideologias. 

De maneira bem simples, eu vejo assim: se você tem onde cair morto hoje, no Brasil, seja em uma cidade grande ou no interior, onde o desenvolvimento foi mais recente ou mais tardio, não importa, você tem condições de se imaginar no lugar das pessoas afetadas pela desapropriação para criação de reservas. 

Qualquer pedacinho de chão que você ou sua família tenha conseguido adquirir honestamente, como um apartamento de 40m2 em São Paulo, uma pousada na praia ou uma fazenda no Mato Grosso, é seu de direito. A segurança jurídica pra garantir esse direito deve ser a mesma pra quem, de boa fé, investiu seu trabalho e esforço em uma propriedade regular, longe de área proibida, invadida, de risco ou em conflito, independentemente do tamanho, tipo ou localização. 

Não da pra entender o princípio, muito menos o apoio que embasa a desapropriação do imóvel do cidadão no interior do Mato Grosso do Sul para criação de reservas indígenas, em detrimento do imóvel do cidadão brasileiro que reside em uma capital ou qualquer região economicamente mais relevante. Quase todo palmo de terra deste pais pertencia a outro povo. 

A comparação não é absurda. Primeiro porque a demarcação é feita aleatoriamente pelo gosto da Funai, muitas vezes onde não há conflito, reivindicação, nem indicio de ligação de certa tribo com o local especifico etc. Se no MS, no PR ou em RR se convive diariamente mais próximo de aldeias e questões indígenas do que em outros estados, isso não impõe uma culpa ou responsabilidade maior aos cidadãos destes locais pela precariedade na assistência ou na preservação da cultura indígena, do que a de qualquer outro cidadão brasileiro. Obviamente que pra quem vive de perto e constantemente questões especificas como esta, é mais natural formar opinião, o que pode ate subentender uma obrigação moral de esclarecer as questões, só isso. 

E estar próximo da situação mostra que trocar terra de mão não vai resolver os contrastes e os problemas. Pelo contrario, faz aumentar a desigualdade, a violência e a pobreza de todos os lados, porque este processo de expulsão é injusto, corrupto, tendencioso e violento. 

Daí sempre tem quem pensa: “mas e os índios não foram expulsos com injustiça e violência ainda maior?” de qualquer maneira, por que é que só algumas pessoas são obrigadas a pagar esta conta hoje?

Apesar da época quando aconteceu a ocupação no país todo, hoje, ela já é consolidada e respaldada exatamente da mesma maneira pra quem mora a Leste ou Oeste, na cidade ou no campo. E o direito de propriedade de todos os cidadãos deve ser respeitado e não relativizado. E não é só o direito a “propriedade”, para os críticos mais extremos, é o direito de não ser arrancado da vida cotidiana, de dar continuidade a historia e a família, de ter onde viver, trabalhar, gerar empregos e movimentar cidades.

Se o objetivo realmente fosse inclusão, teria sim como diminuir o sofrimento e a discriminação aos povos e descendentes indígenas. E não seria resumindo em dar mais terras e um monte de bolsas assistências. Ha muitos exemplos pelos pais dessa descolonização e ausência de estado que só fez aumentar a confusão. Não. Não da pra voltar no passado e tampouco da pra resolver a questão como se vivêssemos no passado e nada tivesse acontecido de lá pra cá, tirando terras de uns pra dar a outros. 

Como, então? Eu acredito que começando a engolir os próprios preconceitos, tanto em relação aos índios quanto aos agricultores, e conhecendo a situação mais de perto pra pensar na solução. Eu apoio a cultura e eu apoio a agricultura. Sim, as duas coisas. 

Eu sou sul matogrossense e eu apoio que as cidadezinhas ameaçadas do interior do estado onde cresci não desapareçam com a criação e ampliação de reservas indígenas.
Eu vivo, conheço e dependo do meio rural e apoio que terras produtivas, dos assentados pelo governo ou de grandes produtores, permaneçam produtivas e com quem as conquistou.

Mas, principalmente eu sou brasileira. Eu apoio que as diferentes culturas que formam nossa identidade sejam resgatadas e valorizadas. Quero viver num país que, apesar de todos os problemas, ainda continua a se desenvolver unido, priorizando a manutenção da paz, valorizando tradições e diminuindo desigualdades de maneira verdadeira e eficiente, não pra gringo ver.

ñande mbae tete

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