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Ler, Refletir e Pensar: A França no Mali, por Francisco Seixas da Costa

Sou fã confesso do estilo de escrita do embaixador português em França, Francisco Seixas da Costa, aliás, muito me honra o fato dele ter passado por aqui em algumas oportunidades.

Abaixo vão algumas observações dele sobre a operação no Mali. É um bom jeito de entrarmos nesse assunto complexo. O texto abaixo é transcrito com autorização do autor, original disponível aqui.

A França no Mali

Por Francisco Seixas da Costa

A intervenção militar da França no Mali é um ato que consagra um grande sentido de responsabilidade política e que constitui uma inestimável contribuição para a segurança global. Legitimada por um mandato inequívoco do Conselho de Segurança da ONU, com o apoio político - e, espera-se, rapidamente também militar, em termos significativos - dos países da região, a decisão do governo francês permitiu evitar a "débacle" do poder político no Mali e conseguiu travar a escalada de progressão das forças extremistas, com forte componente estrangeira, no Norte do país.

São perfeitamente irresponsáveis, pelo que devem ser tidos por irrelevantes, os comentários negativos feitos a propósito desta intervenção militar. A França não está a praticar nenhum ato de "neo-colonialismo" ou a somar um episódio mais à história da "Françafrique", uma política que, por muitos anos, apenas significou a defesa das ditaduras do continente que Paris entendia dever conservar no poder. Esta ação é essencial para tentar evitar a disseminação do extremismo islâmico, levado a cabo por um "franchising" do Al Qeda. Os países responsáveis não devem furtar-se a contribuir para complementar esta ação liderada pela França, muito em particular ajudando as estruturas malianas a reforçarem as suas capacidades próprias, por forma a garantirem futuramente a soberania e a estabilidade no país.

Esta ação militar não deve fazer esquecer que permanece, no Mali, um sério problema político, que se prende com os equilíbrios entre o Norte e o Sul do país. A intervenção militar, com os custos humanos e financeiros que implica, deve também aproveitar a oportunidade, em estreita ligação com as forças regionais da CEDEAO, para forçar as autoridades de Bamako a encetarem, logo que as condições de estabilidade mínima estejam garantidas, um processo de reconciliação interna. Mas é importante deixar claro que, sem esta ação militar, o Mali entraria numa situação de caos que seria impeditiva de qualquer solução política minimamente eficaz. Só não vê isto quem não quer ver.

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