Confesso que descobri por intermédio da conta no Twitter da revista ‘Foreign Affairs’ que hoje se comemora o Dia Internacional das Meninas, esse dia que visa promover os direitos das meninas e das adolescentes e não se enganem elas são vitimas preferenciais da crueldade humana.
Quis o destino que esse importante dia de conscientização caísse na mesma semana que uma jovem menina ativista paquistanesa foi alvo de um atentado a tiros, por defender que as meninas de sua terra (o relutante aliado ocidental Paquistão) recebam educação formal e sejam incentivadas a isso e não constrangidas e ameaçadas como ocorre agora. A jovem Malala Yousafzai tem apenas 14 anos, mas já demonstrou coragem superior. Como Rosa Parks ela não queria revolucionar o mundo, queria apenas que algo muito natural ocorresse.
Não, o Paquistão não é um Estado misógino per se, o país já teve uma líder mulher e até mesmo deu a jovem Malala um prêmio por seu trabalho pela alfabetização e o governo prometeu fazer o possível – incluindo mandá-la para outros países – para que receba excelente tratamento médico e crianças em sua região fazem vigílias pedindo seu pronto re-estabelecimento, mas ocorre que há sim elementos radicais e retrógrados inseridos nessa sociedade e seu discurso encontra infelizmente cada vez mais eco. Os talibãs são um perigo real para a estabilidade do regime e de todo o mundo, dado o complicador que são as armas nucleares paquistanesas.
Queria entender que tipo de linha de pensamento leva a crença que uma mulher educada é uma ameaça a sociedade? Talvez, por que a educação possa acabar com abusos como das meninas-noivas, infiro.
Mas, não caiam no simplismo de crer que isso é algo ocidente contra oriente, por que quantos são os casos de meninas seqüestradas jovenzinhas para serem comercializadas no nocivo mercado da prostituição infantil e tráfico internacional de seres humanos, aqui em nosso próprio país? Ou as meninas que são verdadeiras escravas trabalhando como domésticas? A violência e os abusos variam, mas estão presentes em todo canto desse planeta.
Muitos analistas de relações internacionais defendem a tese do relativismo cultural como o impedimento natural para existência de uma noção única de Direitos Humanos e que no caso da promoção dos direitos das mulheres o que há é uma imposição ocidental colonialista e racista, posto que seria calcada numa pretensa noção de superioridade civilizacional e racial.
Eu acredito que há uma noção única de dignidade humana que nos une como espécie e se apresenta, por exemplo, no fato de ser culturalmente universal a existência de cerimônias para honrar e marcar a despedida de nossos mortos, também é universal o direito e a vontade de viver, de sonhar. Claro, que isso não é base jurídica para justificar a existência dos Direitos Humanos, mas é base moral para defendê-los.
Justificar a inação diante das violações dos direitos dessas meninas à vida, a não serem mutiladas, a serem educadas e respeitadas é ser cúmplice e dizer que isso é cultural ou religioso é querer crer que as condutas humanas são estanques e que as sociedades e religiões não evoluem.
Mas, nós sabemos que para quem pensa assim é mais importante a retórica de resistência ao ocidente (leia-se EUA) do que a situação das mulheres ou das minorias religiosas.
Que esse Dia Internacional das Meninas nos faça debater e pensar sobre a situação das meninas de modo franco e direto e que não se perca e se transforme em um dia de compartilhar mensagens “fofinhas” em redes sociais e gestos vazios e politicamente interesseiros de supostos defensores da causa da mulher. Afinal, esse não é um dia cor de rosa, mas vermelho com o sangue das meninas do mundo.
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