Grande parte do mundo muçulmano sofre com protestos e contraprotestos (que denunciam a violência dos primeiros) supostamente motivados por um filme completamente amador e que passaria abaixo do radar de qualquer um se não fosse a violência da reação.
A verdade é que desde a queda de grandes ditaduras no Oriente Médio e no Norte da África que vários grupos têm disputado o poder e um tem se mostrado particularmente engajado em impor sua visão de mundo e de governo. Claro, que falo de radicais pertencentes a corrente Salafita, que segundos relatos são financiad0s por wahabitas sauditas. São os mesmos radicais que atacam hotéis que servem álcool, que atacaram bordeis durante a primavera e hostilizaram as atletas olímpicas.
É claro que não é fácil introduzir uma agenda radical no tecido social de sociedades complexas como as do Norte da África, os radicais fundamentalistas podem defender idéias retrógadas, mas isso não quer dizer que esses homens não possuam planejamento estratégico e tático bastante sofisticado. E a estratégia parece clara, controlar a narrativa, isto é, estar a frente das ações e se colocarem como defensores da fé e da ideia de civilização de matriz islâmica, uma noção que pode comprar muita simpatia e apoio na chamada “Rua Árabe”, mas para isso se dar será preciso uma ação intempestiva de Washington.
O filme que supostamente ridiculariza o profeta Maomé representa o que pode ser mais negativo na liberdade, mas seguindo a máxima de Tocqueville, a solução pra isso é mais liberdade. Mas, sendo ou não um subproduto da liberdade de expressão, esse incidente permitiu uma escalada da agenda radical, que obrigou até a Irmandade Muçulmana a reagir e organizar protestos ontem (também em busca de controlar a narrativa), no Cairo e ao governo egípcio a honrar seus compromissos e proteger as representações diplomáticas.
Essa reação moderada que imagino ser o melhor caminho para os EUA e para as nações ocidentais não pode deixar de levar algumas coisas em consideração, como bem colocou o diplomata e professor Paulo Roberto de Almeida em seu blog:
“Seja como for, volta e meia surgem conflitos como este que agora se alastrou em diferentes países islâmicos contra um filme idiota feito nos EUA e que ofende, ao que parece, Maomé, considerado profeta nessa religião. Profeta não é deus, mas um emissário de deus, ou o seu porta-voz, para os que crêem. Seja qual for a agressão cometida contra esse profeta, a violência irracional, deslanchada contra alvos americanos, ocidentais, cristãos -- em países como Afeganistão, Argélia, Bangladesh, Egito, Índia, Irã, Iraque, Líbano, Líbia, Malásia, Paquistão, Sudão e Yemen, entre outros -- é algo inaceitável para os nossos padrões civilizatórios. Matar em nome da religião é algo bárbaro, selvagem, e como tal deve ser condenado.” [Grifo Meu]
As ofensas do filme podem mesmo ser o motivo da indignação da massa de manobra, dos chamados idiotas úteis, mas pelo que vemos o que há em disputa é muito maior que um suposto choque cultural.
A questão que surge é se Obama tão afeito aos ataques com drones irá conseguir não escalar a situação e dar o controle da narrativa aos radicais.
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