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Choques culturais também são feitos de pequenas gafes

Era uma agradável noite de inverno andino, estávamos em missão de nossa universidade, como parte da comitiva que assinaria um importante acordo técnico com a universidade local.

A pequena cidade que abrigava a universidade se mobilizou para que nossa visita fosse a mais profícua possível, Essa mobilização envolveu as autoridades políticas locais que reservaram tempo em suas agendas para nos oferecer uma recepção oficial, que consistia num animado jantar, em um museu de artes situado numa linda praça de casario colonial espanhol.

A aquela altura já estávamos habituados a cozinha local e sua paleta de sabores distinta da nacional, mas nada que causasse grande choque. Após o jantar fomos agraciados com a apresentação de grupo de danças regionais apoiado pelos governos locais e estaduais (no caso equivalente a estadual). Ao fim das apresentações os políticos já devidamente relaxados pelo vinho se permitiam encantar com o encanto das colegas que faziam parte da missão e correndo o risco de parecer machista quem resiste a chance de confraternizar com moças de vinte e poucos anos, todas lindas. Elas claro estavam cientes de seus deveres protocolares e sob o rígido olhar da nossa ‘chefe de missão’ navegavam com destreza por essa situação toda.

A banda que animava o baile que o jantar havia se convertido era experiente e talentosa e havia preparado um repertório que incluía canções tradicionais da região e do país que nos abrigava e conhecidas canções em língua espanhola. Naturalmente, como bons hóspedes que éramos obrigados tentávamos – com um excesso de energia e descontração que tanto marcam as relações humanas no Brasil – deixar claro que estávamos ‘muy contentos’.

Logo ficou claro uma pequena comoção entre os assessores do governador e do prefeito com o maestro da banda, a aspereza dessas conversas não nos escapou a atenção. Até que nossa chefe de missão, com a experiência de várias décadas em Organismos Internacionais nos informou que nosso entusiasmado e bem-intencionado “U-HULLLL” ao final das canções era entendido na suscetibilidade local, como uma vaia.

Rapidamente foi desfeito esse mal-entendido, uma bobeira em relação ao tamanho do esforço que se fazia para que nossa experiência lá fosse perfeita, mas que poderia ter criado problemas durante o resto de nossa estada.

Comentários

Carolina Valente disse…
Lembro-me muito bem desse jantar! Cada U-huuuuu nosso era uma bronca no maestro, tadinho!!!

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