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Formatura do Rio Branco ou lá vou eu meter mão em cumbuca

Alguns dos meus mais íntimos amigos dizem que eu pareço gostar de polêmica ou de ser do contra. Bom, talvez eles estejam certos. Mas, de uma coisa eu tenho certeza há momentos em que não suporto me calar em concordar apenas para ser aceito e querido.

Feita essa introdução um tanto mais pessoal que o que deveria vamos ao assunto. Dia 20 de abril foi realizada a cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco, onde estudam e são formados os diplomatas brasileiros. A cerimônia é importante e conta com a cúpula da república os discursos de autoridades feitos nesse evento marcam o tom da atuação diplomática brasileira.

O discurso da secretária Maria Eugênia Zabotto Pulino, oradora da turma, chamou atenção da imprensa (aqui, por exemplo) por ter tocado nos chamados temas sociais e pela defesa que ela faz da escolha do nome da turma, que foi uma merecida homenagem a diplomata Milena Oliveira de Medeiros que faleceu em decorrência da malária contraída em missão na África.

A oradora ao justificar a homenagem a colega caída escolheu enfatizar a origem racial e o gênero da homenageada, enfatizando que era mulher e negra em oposição ao velho Barão que era homem, branco e “nascido na capital do império”. Essa oposição foi a tônica do discurso e arrancou aplausos nas redes sociais e no auditório.

Confesso que estranhei a falta de citações a frases e escritos da homenageada (que com certeza deixou, posto a alta exigência intelectual do CACD e o perfil dos que se interessam pelo campo) é como se a justa homenagem a uma moça que deu – inadvertidamente – a vida pelo seu país, cumprido seu dever fosse somente por que era negra e mulher. Pode não ter sido essa a intenção dos autores do discurso, mas foi isso que se pode depreender do que foi lido.

É esse o problema de transformar pessoas em emblemas de causas, retira-se sua humanidade, o que lhe fazia único e se apega ao genérico. Tendo a achar uma injustiça, ainda que seja uma linda homenagem, sim é paradoxal, mesmo.

Como não poderia ser diferente o discurso é altamente laudatório com o paraninfo da turma o embaixador Samuel Pinheiro, que foi um dos principais articuladores da expansão da carreira diplomática, ou seja, acaba por soar altamente corporativista que os beneficiados pela expansão das vagas homenageiem a visão do homem que é responsável pelo seu benefício. O irônico é que a ênfase sul-sul do paraninfo foi o que acabou levando a diplomata homenageada a África, onde ocorreu a sua fortuita e infeliz contaminação.

A oposição de idéias que me refiro continua ao afirmar que a diplomacia do passado não estaria conectada aos interesses da população e, portanto – não é dito, mas fica implícito, seria a diplomacia das elites ou contrário da atual que seria a diplomacia que verdadeira reflete os valores plurais e democráticos da sociedade brasileira. Essa crítica feita para soar e ressoar aos ouvidos da cúpula do governo é no mínimo controverso quando confrontando com um estudo independente da Política Externa Brasileira.

Sobre o tom racialista do discurso, meu amigo e diplomata de carreira Paulo Roberto de Almeida escreveu (original pode ser lido, aqui):

Curiosas essas constatações que o Itamaraty é majoritariamente branco e masculino. A culpa é da instituição, de alguém em particular? Os exames são sexistas, racistas, discriminatórios?

Essa versão politicamente correta, que busca responsáveis por nossas deficiências e "vias rápidas" para corrigir o que se entende seja uma "deformação do sistema" -- quem sabe até uma das muitas perversidades da sociedade capitalista, elitista, e outros vícios mais -- e que pretende sanar os problemas pela "inclusão dos excluídos", sempre me pareceu uma tremenda demagogia, e um atentado notório ao princípio da igualdade e do mérito. Todas as pessoas, a partir de uma certa idade, têm condições de se preparar para um exame reconhecidamente difícil como o do Itamaraty. 

Ainda que se reconheça que certas pessoas -- pelo background familiar, pela freqüentação das péssimas escolas públicas, por uma série de outros fatores desfavoráveis -- enfrentam dificuldades adicionais nesse tipo de exame extremamente rigoroso, a única recomendação que se poderia fazer seria que as universidades, o próprio Itamaraty, entidades supostamente comprometidas com a "igualdade racial" e a "inclusão social" mantenham cursos preparatórios gratuitos, abertos preferencialmente aos que não dispõem de renda, sob declaração de honra, para pagar os cursos comerciais. 

Bolsas para afrodescendentes são inerentemente discriminatórias e racistas, e não deveriam existir nessa forma, com base na cor.

Mas a voz dos "excluídos" é bem mais forte quando enrolada na bandeira da cor, e da suposta desigualdade da antiga escravidão.

O discurso é exatamente o que se espera de uma diplomata brasileira, ou seja, bem escrito e lido com competência e carisma, como vocês poderão constatar abaixo. Seu conteúdo reflete muito bem o Zeitgeist. Tenho consciência que a essa altura irritei muita gente, mas, meus caros, esse é o preço de ter uma opinião.

Comentários

Anônimo disse…
vírgulas. use-as.
Mário Machado disse…
É o risco de escrever rapidamente pra não perder o fio da meada e não ter tempo pra revisar. Na madrugada eu farei. Obrigado.
Anônimo disse…
Mário,

Sua credibilidade é fruto de suas opiniões sinceras aliadas a um espaço livre de amarras comerciais. Espero que continues assim pois aqui sei que posso ler artigos e textos que emitem opiniões sem medo de expor problemas, apontar fragilidades. Essa é a maravilhosa liberdade de expressão tão valiosa em nosso país.

Retomando o assunto do post, tenho que concordar contigo que o enfoque nas diferenças de gênero e raça sobressariam por demais. Dos 12 minutos de discurso, os 6 primeiros só falaram das diferenças de gênero e raça. Assim como você mencionou que a tônica do discurso sobressaiu às qualidades profissionais da diplomata Milena de Oliveira Medeiros então apimento com a seguinte indagação: então a oradora foi escolhida por ser mulher e representar uma minoria ao invés de ser escolhida por seu desenpenho acadêmico e representatividade da turma?

Não, não acho que o Itamaraty tenha que ter um quadro de funcionários que seja coerente com as caracteristicas do país como sugere a oradora. Isso não garante efetividade das politicas externas do Brasil, finalidade do trabalho desenvolvido por esses servidores.

A carreira diplomática é também uma escolha pessoal. Acredito que naturalmente mais mulheres e negros e indios ingressarão na carreira conforme o país for se desenvolvendo e, principalmente, conforme aumente a percepção de que há também igualdade de oportunidades de crescimento e tratamento dentro do próprio Itamaraty.

Um abraço de uma minoria para outra minoria meu amigo.
Anônimo disse…
Diferentemente do prof. Paulo Roberto de Almeida e da Secretário Maria Eugênia Zabotto Pulino, você escreve muito mal. Sua argumentação não é inteligível. Tentei com todas as forças entender aonde você queria chegar, mas não fui feliz nessa empreitada.
Mário Machado disse…
Discordância civilizada tem espaço aqui. Mesmo, as venenosas e provocativas.

Uma pena que não foi capaz de compreender o que escrevi. Outros foram, inclusive o professor citado. É o risco de se expor e opinar na internet.

Volte sempre. Não, não é ironia. Faço uma média entre as críticas (mesmo anônimas, que tem um peso menor do que quem mostra se mostra) e os elogios para tentar auferir como estou a me sair.

Sim, admito é um exercício fútil.

Abraços,

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