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1 ano desde que Namuzo se moveu ou sobre o terremoto seguido de Tsunami que varreu o Japão

Ontem foi o aniversário da tragédia que se abateu sobre o Japão na forma de um poderoso terremoto, de um mortal maremoto e como se não bastasse uma crise nuclear se seguiu aos desastres naturais.

A escala da tragédia desafia nossa capacidade de imaginação e preciso, contudo, pontuar e enaltecer a resiliência japonesa (como fiz aqui, ainda sob o impacto da tragédia).

Para marcar esse funesto aniversário (cujo impacto pode ser medido na overdose de adjetivos que estou a cometer) vou reeditar um texto que escrevi sob o impacto das primeiras imagens que chegavam do Japão. O texto foi originalmente publicado aqui.

O que dizer diante da tragédia no Japão?

Namuzo é um bagre (Catfish) melindroso e perigoso que vive embaixo das ilhas do Japão e toda vez que se movimenta causa terremotos. Por isso Namuzo é guardado de perto pelo Deus Xintoísta Kashima que mantém o elusivo peixe quieto com uma grande pedra de granito, mas Kashima por vezes perde a atenção e o peixe se move. Nesse dia 11 de março, mais uma vez Kashima se distraiu.

As imagens que nos chegam do Japão são absurdamente assustadoras. Não consigo concatenar muitas palavras para conseguir descrever o horror que provocam. É até lugar comum pensar na pequenez humana comparada com a força bruta do planeta. É inconcebível para alguém como eu, que nunca viveu um terremoto não poder contar a estabilidade daquilo que temos como mais firme que é o próprio chão.

A brutal imagem do Tsunami invadido e varrendo a costa daquele país nos dá noção do tamanho do desafio que ainda resta para a engenharia no que tange a criar mecanismos que possam eventualmente dirimir os impactos das nefastas ondas gigantes. Não creio, contudo, que avanços significativos serão alcançados nessa área nas próximas décadas.

E se não bastasse o terremoto e a Tsunami ainda há a questão dos reatores nucleares, segundo relatos em um desses reatores o sistema que garante o resfriamento do núcleo do reator falhou bem como os mecanismos de emergência e há o risco de um derretimento das barras que alimentam o reator. De fato a situação e de tal maneira perigosas que as forças militares dos EUA que possuem bases no Japão agiram para entregar agentes refrigerantes para o reator, mas a situação ainda é incerta e se fala em liberação de vapor radioativo para reduzir a pressão.

Ainda não se tem uma estimativa fiável dos custos para reconstruir as áreas devastadas, de fato o governo do Japão é um dos mais endividados do mundo desenvolvido. Indo além do material devo dizer que temo pelo número de vítimas dessa tragédia, ainda que o povo desse país seja treinado para reagir a desastres a escala foi tamanha... Sem querer transformar essa página num espaço para repartir minhas angústias, mas de fato temo por esses números.

A preparação do Japão é digna de nota e de copia. Não só na questão das normas de construção (e sua fiscalização) como nos sistemas de alerta e alarme, mas também no preparo dos cidadãos. Do preparo vem a Ordem (repleta de preocupação e temor é claro) que vimos os japoneses reagirem. É fato que esse conjunto de ações preventivas devem ter salvado incontáveis vidas. E sem querer sem mesquinho, mas não consigo deixar de pensar na inépcia dos dirigentes brasileiros em criar sistemas assim para enchentes.

Não consigo de deixar de pensar nos mais de 300 mil brasileiros que vivem no Japão e no sofrimento de suas famílias e claro não há como ficar impassível diante do sofrimento da vasta colônia japonesa que aqui reside que busca por noticias de compatriotas que deixaram para trás.

O mundo reagiu como devia, com mostras de solidariedade e ofertas de ajuda. E pode essa ser a oportunidade para que algumas tensões se dissipem entre Japão e China. Independente de crer ou não na história de Namuzo nos resta torcer para que Kashima não se distraia novamente. E já que ando pela esfera do sobrenatural deixo aqui minhas orações para o povo do Japão.

Força e fé.

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