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London Calling ou um sonho olímpico

London calling to the faraway towns.  Now that war is declared and battle come down.

The Clash

Sim, eu vou ousar em pleno décimo aniversário dos ataques de 11 de setembro de 2001 falar de outra coisa. E não, não vou lembrar o “outro 11 de setembro” que é o sangrento golpe contra Salvador Allende e o nefasto bombardeio ao belo Palácio de La Moneda. É preciso que fique claro que isso não é um ato de rebeldia ou uma declaração minha de que não vejo como historicamente significativos os atos terroristas, por sinal escrevi sobre isso recentemente (ontem, pra ser mais exato). Mudo de assunto é por que vejo que o momento não é o melhor para publicar alguma análise sobre o 11 de setembro ou a guerra ao terror. Não é o momento por que a essa altura estamos todos saturados desde sexta-feira especialistas, professores, testemunhas oculares, vítimas têm tido considerável espaço nos meios de comunicação. Assim, espero que me perdoem por ser “herético” e falar de outro assunto, que talvez na grande escala das coisas seja até um assunto tremendamente fútil. E já que estou a pedir desculpas, perdoem também um longo parágrafo inicial que rompe com as regras do bem escrever e até agora não entrou no assunto.

Ontem em Mar del Plata, na Argentina um grupo de homens brasileiros jogou contra um grupo de homens dominicanos em uma partida de um esporte cujo objetivo é acertar um objeto esférico dentro de um aro protegido pelo outro time. É óbvio que falo de um jogo de basquete, mais precisamente da semifinal da Copa América, que nessa edição vale como pré-olímpico das Américas.

O prêmio da partida além da óbvia progressão para a final do torneio era a vaga garantida nos Jogos Olímpicos de Londres, 2012. E os 12 homens do Brasil conseguiram conquistar a vaga olímpica, um feito, meus caros, enorme no mundo dos esportes, havia 16 anos desde a última vez que isso acontecera.

A partida foi nervosa e emocionante. O Brasil enfrentou uma equipe que possuía um jogo forte de garrafão, isto é, seus jogadores altos e fortes eram mais altos e mais fortes que os do Brasil. Isso resulta em uma situação danosa a qualquer equipe de basquete já que para tentar diminuir o jogo no garrafão se acaba por cometer muitas faltas o que é duplamente penalizado pelas regras do basquete, já que a partir da quinta falta coletiva num mesmo quarto de partida, todas as faltas (exceto as faltas de ataque com posse de bola) garantem arremessos livres a equipe rival e a quinta falta individual elimina o atleta de quadra.

O basquete brasileiro já foi um esporte difundido e vencedor chegou a ser bi-campeão mundial entre os homens, e campeão mundial entre as mulheres e creio que todos com alguma idade lembram-se de nomes como Oscar, o mão santa, “Rainha” Hortência, “Magic” Paula, etc. Contudo, desde os Jogos de Atlanta, em 1996 (a maioria de vocês nem lembra disso), o último da carreira do grande Oscar (o maior pontuador da história das Olimpíadas e membro do Hall of Fame do Basquetebol) o Brasil não conseguia se classificar.

E é aqui que fica interessante reparar como as estruturas da sociedade brasileira seguem padrões similares a dos governos. Ou seja, as federações se mostraram personalistas, com pouca renovação nas lideranças e ineficazes no cumprimento de seus objetivos institucionais.

Mas, na noite de ontem o que assistimos em Mar del Plata não foi o triunfo do voluntarismo de poucos talentosos, vimos a vitória de um projeto estruturado, vimos a vitória do esforço coletivo e da responsabilidade individual, vimos o resultado da consistência, esforço, preparação e criatividade sobre a cultura do perpétuo improviso e da dependência de um “salvador”. E a meu ver isso é uma lição que pode ser transplantada pra nossa vida social, ainda mais agora que a sociedade civil brasileira dá mostras de um renascimento (ainda incipiente é preciso salientar) como nos mostra as passeatas contra a corrupção.

Eu poderia escrever aqui o tanto que eu admiro jogadores como o Alex Garcia que é capaz de se doar como poucos na defesa e sempre joga com vigor e dedicação, mas creio que isso é melhor feito pelos escritores do esporte eu não conseguiria transmitir a mesma emoção. Só posso dizer que foi comovente ver o sacrifício que jogadores como o Guilherme Giovannoni que praticamente sacrificou seu potencial ofensivo para defender, para marcar um jogador mais alto, mais forte e muito talentoso. Esse tipo de jogo em equipe em que ninguém abandona cegamente sua individualidade, mas passa coloca suas pontencialidades e sua criatividade a serviço da equipe é um exemplo para todos nós. Afinal, a sociedade que vivemos é responsabilidade de cada um e cabe a nós não só pressionar governos e exigir de autoridades, mas fazer nós mesmos sem depender do Estado.

Creio que a essa altura está claro o tanto que eu amo esse jogo e não é só por que fui praticante “federado” na base e hoje sou praticante em equipes amadoras (por puro prazer), mas por que esse esporte foi responsável pelo meu interesse no mundo, nas Coisas Internacionais, se eu não tivesse jogado não teria aprendido as línguas estrangeiras que sei e mais que isso talvez não tivesse a confiança em mim mesmo que tanto é importante na vida. Outra que deve estar clara é que meu amor por esse jogo pode ter me levado a exagerar a importância dos exemplos do esporte para a nossa vida social, mas disso vocês serão os juízes.

Comentários

Como egresso da UNESP de Franca, um dos últimos rincões paulistas do esporte, claro que tenho minha afinidade pelo basquete. Pena que o Brasil não tenha perdido a final, mas como disse, o que valeu foi esa superação. Deve estar bem interessante o noticiário esportivo local, exaltando os atletas do Brasília. E fico a imaginar a cara do povo da NBA que não quis participar (e se vão pros jogos ano que vem...)
Mário Machado disse…
Franca é Franca no basquete, embora Brasília também tenha sua tradição. De fato fui bairrista ao destacar o Alex e o Giovannoni. rs.

O problema foi o começo do primeiro quarto, trágico. Mas, gostei da reação esse time ainda trará glórias.

O Nene faz falta no garrafão, mas eu não chamaria pro filé quem não quis roer o osso.

Varejão deve voltar pq estava de verdade machucado. O resto.. "burn in hell".

Abs,

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