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Ler, Refletir e Pensar: Dr. Mauricio Santoro “O Câncer de Chávez”

Uma análise sobre as repercussões políticas da doença de Chávez feita pelo meu colega professor de Relações Internacionais da FGV, Mauricio Santoro, em seu blog “Todos os fogos o fogo”.

O Câncer de Chávez

Pondo fim a quase um mês de boatos e especulações, o presidente da Venezuela anunciou que está com câncer. A doença foi diagnosticada quando Hugo Chávez foi operado de emergência em Cuba, após se sentir mal em uma viagem ao exterior. A doença coloca em dúvida a capacidade de Chávez em concorrer à reeleição em 2012 e abre dúvidas sobre o futuro político de seu movimento, extremamente centrado em sua liderança pessoal.

Pela Constituição da Venezuela, o presidente não pode se ausentar mais de 5 dias sem transferir o cargo provisoriamente. Chávez sempre evitou fazer isso, por medo de que se repetisse uma crise semelhante àquela do golpe de 2002. O presidente está há quase um mês hospitalizado em Cuba – aparentemente, não confia nos médicos venezuelanos – mas a Assembléia Legislativa o autorizou a governar de lá.

O diagnóstico foi marcado por segredo e Chávez não falava em público, ou sequer se comunicava via rádio ou Twitter há várias semanas. Ele apareceu bastante abatido e muito magro, quase tanto como da primeira vez em que irrompeu na cena política venezuelana, há 20 anos, como um jovem tenente-coronel que tentou tomar o poder num golpe militar.

A reação dos chavistas é a de que o presidente pode se curar da doença e disputar a eleição no próximo ano, a exemplo do que fez Dilma Rousseff no Brasil. A saúde da presidente brasileira ainda é objeto de dúvidas e rumores, e no entanto ela fez o anúncio de sua doença de forma bem mais confiante e aberta do que Chávez. Além de ter sido tratada em seu próprio país.

A oposição venezuelana, naturalmente, ressalta a falta de transparência de Chávez com relação à sua saúde e a situação anômala do presidente governar de Cuba, em vez de transferir o cargo ao vice. No ambiente de polarização extrema da Venezuela, dificilmente a doença de Chávez despertará simpatia e compaixão entre seus opositores ou na população em geral, como ocorreu na Argentina quando a morte de Néstor Kirchner beneficiou a presidente-viúva, Cristina.

A política venezuelana da década de 2000 se polarizou de tal modo que tudo gira em torno de Chávez, em facções pró e contra, mas há pouco debate real em termos de modelo econômico e político, e isso é cada vez mais importante no contexto da crise que afeta o país, com queda constante de lucros da estatal petrolífera PDVSA (e principal fonte de receitas do Estado) – 30% a menos desde 2008.

É improvável que Chávez aceite delegar poder a um número 2 e nomear um sucessor político, mesmo que sua doença se agrave ao longo dos próximos meses. A questão é saber se a oposição conseguirá superar sua fragmentação e montar uma coalizão com proposta alternativa para disputar as eleições presidenciais em 2012.

Ainda não há data definida para o retorno de Chávez à Venezuela, mas isso deve ocorrer no dia 5 de julho, quando acontecem as celebrações pelos 200 anos de independência do país.

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