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Resiliência

A resiliência é a capacidade de certos materiais possuem em resistir a grande estresse sem apresentar ruptura e ainda acumulando energia. Essa característica de tranformar pressão e estresse em energia é muito desejada basta pensa numa vara de saltos que transforma o estresse que está submetida em impulso para os atletas. Por isso essa imagem é usada pela psicologia para definir a capacidade de lidar e superar adversidades. É claro que a física já nos mostra que um metal resiliente pode apresentar deformações, mas se manterá intacto e o mesmo vale as pessoas resilientes.

Não há exemplo mais contemporâneo de uma sociedade que cultiva uma cultura que leva a resiliência de seus membros como a sociedade japonesa. É claro que é preciso ter - o cada vez mais ausente nas sociedades ocidentais – caráter estóico para lidar com a reconstrução de um país cabisbaixo pela sua primeira grande derrota militar e com duas bombas atômicas detonadas em seu solo. Isso por si só já atesta a fortaleza desse povo

Claro que o Japão tem seus “crimes” – embora caiba a discussão se uma geração carrega a culpa por atos feitos por outra, tendo a achar que não embora as lições da História fiquem – e já protagonizou momentos trágicos em suas incursões expansionistas pela Ásia, mas sem querer diminuir o absurdo que se passou nenhum povo, nenhum ajuntamento humano em nenhum continente tem sua História livre de massacres, invasões, guerras e comportamentos destrutivos e preconceituosos.

Mas, como coloquei acima os crimes do Império Japonês durante a Segunda Guerra Mundial não diminui a inspiração que a resistência do povo japonês diante dos desastres que afligem seu populoso arquipélago. Como eu disse dia 11 de março, nesse mesmo blog (aqui):

Namuzo é um bagre (Catfish) melindroso e perigoso que vive embaixo das ilhas do Japão e toda vez que se movimenta causa terremotos. Por isso Namuzo é guardado de perto pelo Deus Xintoísta Kashima que mantém o elusivo peixe quieto com uma grande pedra de granito, mas Kashima por vezes perde a atenção e o peixe se move. Nesse dia 11 de março, mais uma vez Kashima se distraiu.

As imagens que nos chegam do Japão são absurdamente assustadoras. Não consigo concatenar muitas palavras para conseguir descrever o horror que provocam. É até lugar comum pensar na pequenez humana comparada com a força bruta do planeta. É inconcebível para alguém como eu, que nunca viveu um terremoto não poder contar a estabilidade daquilo que temos como mais firme que é o próprio chão.

A brutal imagem do Tsunami invadido e varrendo a costa daquele país nos dá noção do tamanho do desafio que ainda resta para a engenharia no que tange a criar mecanismos que possam eventualmente dirimir os impactos das nefastas ondas gigantes. Não creio, contudo, que avanços significativos serão alcançados nessa área nas próximas décadas.

E se não bastasse o terremoto e a Tsunami ainda há a questão dos reatores nucleares, segundo relatos em um desses reatores o sistema que garante o resfriamento do núcleo do reator falhou bem como os mecanismos de emergência e há o risco de um derretimento das barras que alimentam o reator. De fato a situação e de tal maneira perigosas que as forças militares dos EUA que possuem bases no Japão agiram para entregar agentes refrigerantes para o reator, mas a situação ainda é incerta e se fala em liberação de vapor radioativo para reduzir a pressão.

E de fato 15 dias depois do forte terremoto e da devastadora Tsunami o reator de Fukushima continua a ser a preocupação número das autoridades japonesas e tem se mostrado um desafio para os planos de contingência e a perícia do técnicos que tentam corrigir os sistemas e resfriar a usina e não só isso mas conter o vazamento de material nuclear. Não é preciso ter Ph.D. em história e/ou sociologia para perceber que as feridas abertas nos ataques nucleares a Hiroshima e Nagazaki continuam na memória coletiva desse povo e isso provoca muita da ansiedade (ordeira, é verdade) que vemos no Japão.

Pelo mundo a fora a velha disputa sobre a energia nuclear voltou a baila e grupos de interesse usam o episódio para com base no medo e no pânico influir na criação de políticas restritivas ao uso da energia nuclear. Se o debate sobre o tema se faz mister é de igual importância não conduzir esse debate tendo o medo e o pânico como guias.

Contudo, esse texto é apenas uma espécie de tributo a quem encontra força para reconstruir e se recusa a se deixar vencer pelas adversidades (admito está meio auto-ajuda). Um tributo aos homens e mulheres resilientes de todas as partes do mundo e em especial aos japoneses que em meio a uma crise econômica e uma crise nuclear lutam para reerguer seu país. Como bem simboliza a espantosa reconstrução da estrada que lida Tóquio e Naka, em apenas 6 dias! Como bem ilustra essa reportagem (a comparação antes e depois da estrada é literalmente de cair o queixo, prestem atenção não só ao asfalto, mas as grades e cercas). Não posso deixar de notar que por força dessa capacidade de reação que o Japão é um exemplo bem acabado de resiliência.

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