O vazamento de documentos da diplomacia americana continua a dominar as atenções da imprensa em muito por conta do método de liberação paulatina dos documentos. Os primeiros documentos produzidos pela embaixada dos EUA, em Brasília, vazados provocaram um mal-estar na esplanada dos ministérios.
Os comentários (devidamente negados) do ministro Jobim expuseram a velada disputa por influência entre ministros e pastas na busca pela primazia da formulação da política externa brasileira.
É fato notório que ninguém gosta de perder poder e prestigio e isso é particularmente verdadeiro em burocracias estatais onde a perda de poder e prestigio é acompanhada pelo inevitável corte orçamentário (ou manutenção do nível de dotação enquanto há expansão em outras partes da máquina).
Muito mais que expor o extremamente transparente (e até certo ponto celebrado por muitos) viés anti-norte, antiamericano do comando do MRE. E aqui é preciso clarificar para quem não acompanha de perto as relações internacionais que esse viés não quer necessariamente dizer rompimento de relações bilaterais ou uma política de hostilidade declarada e sim uma série de ações que parecem afirmar a independência brasileira, mas são tomadas com base em não “aquiescer” aos Estados Unidos e não com base no interesse nacional. Afinal, nada mais natural do que discordar dos EUA quanto assim aponto o interesse nacional.
O que o vazamento expôs é a intima comunicação entre política interna e externa, que alguns analistas e teóricos parecem acreditar que são hermeticamente separadas. Ou seja, em sua busca por uma melhor posição nas decisões do governo o ministro Jobim construiu uma boa relação com o embaixador americano, uma relação de confiança pelo teor das conversas. Essa relação o colocaria como alguém que tem que ser levado em conta quando o assunto fosse Estados Unidos e visava dar autonomia a defesa para conduzir algumas ações externas sem necessariamente precisar do crivo de aprovação do MRE e de Marco Aurélio Garcia.
As revelações do que pensam os diplomatas americanos e o que consideram relevante para informar seu ministério é uma boa ferramenta para aferir os modelos analíticos usados no mundo real e como são muito mais intuitivos do que os modelos paradigmáticos da sistematização acadêmica. Isso mostra o quanto o conhecimento e a cultura são necessários para a analise das relações internacionais, mas que essa não prescinde da experiência e do tato do analista, de um certo desprendimento a métodos rígidos (ainda que possamos ver conceitos e influências teóricas, algo muito próximo do que tratei na postagem “Pensamento sem teoria?”), mas sobretudo expõe algo que meu querido professor Martchenko sempre tentou nos ensinar analisar relações internacionais é acima de tudo coletar e processar informações.
Para os estudantes que aqui freqüentemente aportam essa é uma lição e tanto, a segunda que podemos depreender desses vazamentos. A primeira é o ceticismo quanto a versões e notas oficiais que tratei no texto anterior.
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P.S: Sem dúvidas há outros aspectos a serem debatidos, portanto novos textos serão publicados. Nesse meio tempo recomendo uma interessante postagem no blog do Dr Mauricio Santoro – Todos os fogos o fogo. As integras dos telegramas podem ser lidos no conhecido site – Política Externa.
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