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Israel mais uma vez no olho do furacão

Mais um incidente trágico no Oriente Médio, envolvendo as Forças de Defesa de Israel – IDF – e ativistas políticos que supostamente levavam ajuda humanitária para a Faixa de Gaza, que está sob embargo naval, por conta do governo do Hamas que domina essa parte dos territórios palestinos.

Até onde sabemos forças israelenses abordaram a flotilha que navegava rumo a Gaza e instruíram esses navios a entregarem suas cargas via portos Israelenses, aparentemente um dos navios se recusou e foi interceptado, os relatos são conflitantes (como sempre), alguns vídeos mostram uma reação dos tripulantes atacando os soldados, inclusive atirando alguns ao mar e isso segundo os Israelenses levou as forças de segurança a reagirem de modo mais radical, seria, portanto um ato de autodefesa.

Os simpatizantes da causa palestina classificam como massacre de civis e mais um crime de Israel. E novamente surgiu o argumento da proporcionalidade, que é muito difícil de medir, o que seria proporcional ou não? Sério de modo objetivo, sem tomar partidos e sem fanatismos políticos que são comuns nessas questões, como medir o que é ou não proporcional? Fica outra indagação foi proporcional a resposta do governo tailandês contra os camisas vermelhas?

Líderes mundiais rapidamente acusaram Israel, o representante turco no Conselho de Segurança chegou a afirmar que Israel perdeu toda sua legitimidade internacional, esse Conselho parece inclinado a determinar uma investigação internacional (que francamente não será imparcial e não sei se uma resolução será possível) sobre o incidente, que resultou em mortes de ativistas políticos, que se dizem pacifista.

Os países ocidentais mais ligados a Israel foram mais contidos e o tom geral foi de pedido para que as Forças de Defesa e que o governo dessa nação demonstre mais autocontrole. A líder da oposição israelense e ex-ministra de relações exteriores Tzipi Livni foi rápida em responder que não há oposição em Israel nesse quesito das políticas de defesa do Estado de Israel, por que seria uma necessidade de defesa, de sobrevivência desse estado manter o bloqueio que impeça que facções locais se armem.

A ONU como de hábito condenou Israel, principalmente a Alta Comissária de Direitos Humanos Navi Pillay. Que aproveitou o ensejo para atacar a questão do bloqueio em si, e não só do episódio envolvendo o navio que supostamente carregaria ajuda humanitária.

Não tenho elementos ainda para analisar a ação e careço de conhecimentos sobre técnicas de combate pessoal em navios para avaliar a conduta dos soldados, mas algo já posso comentar com segurança o incidente lamentável será usado a exaustão por todos os lados, já vemos grupos radicais e de esquerda fazendo suas tradicionais queimas de bandeira.

O governo turco lidera a ofensiva diplomática, não só junto ao Conselho de Segurança (ao qual preside no momento), mas junto a OTAN, também. Essa posição turca coloca a diplomacia americana em uma difícil posição entre dois aliados tradicionais e importantes. Em um momento em que as relações diplomáticas entre eles não estão em um ponto de alta, diriam os analistas que há muito ruído entre EUA e Israel, EUA e Turquia e Turquia e Israel. Será interessante observar como o governo Obama irá lidar nesse cenário complexo, com muito pouco espaço de manobra entre esses tradicionais aliados, numa região muito hostil a Washington.

Não obstante a natureza da flotilha e o conteúdo de sua carga o ato de desafiar o bloqueio foi politicamente deliberado, um ato de provocação em uma região demasiadamente tensionada. É preciso lembrar o obvio os soldados de Israel e os palestinos são humanos, ou seja, são pessoas que vivem sob uma intensa pressão diariamente. E como vemos sempre basta muito pouco para que essa tensão se transforme em respostas veementes e violentas. (UPDATE: acabo de ver que o Embaixador de Israel, no Brasil, usou o mesmo argumento, mas já havia escrito antes de ouvir essas declarações. Uma vez mais a lógica mostra sua força)

A meu ver ilegal ou não tentar se forçar contra um bloqueio naval feito por uma força que se vê ameaçada existencialmente foi uma tolice bastante contra-produtiva se o objetivo era levar suprimentos necessários ao povo de Gaza, ao povo repito. Se a intenção era política, isto é, forçar a prisão de ativistas conhecidos até recipientes do Nobel da Paz e a partir daí instigar um maior isolamento de Israel e ajudar no reconhecimento do governo do Hamas como legitimo e de sua causa como certa e nobre a resistência da flotilha a abordagem israelense se torna mais verossímil, por que apesar do risco físico uma ação mais brusca de Israel (como a que ocorreu) seria a prova da natureza criminosa desse Estado, provando assim a tese defendida por esses grupos.

A análise política no Oriente Médio exige de quem se aventura em fazê-la muita cautela na hora de chegar a conclusões, por que é uma região recheada de interesses conflitantes, todos eles capazes de arregimentar setores da imprensa, da academia, dos partidos, dos movimentos sociais, em resumo dos vários extratos da opinião pública para defender suas teses. Raramente se tem acesso a fatos sobre a região, quase sempre temos interpretações dadas como fatos. Ao que se sobrepõe o açodamento das chancelarias em emitir notas.

A guerra de versões perdurará por muito tempo e esse assunto tenho certeza será “hot issue” por vários dias. Uma investigação independente seria muito útil para causa da verdade, para sabermos o que ocorreu como ocorreu e por que ocorreu. Contudo, isso pode não interessar aos atores envoltos da Turquia a Israel, dos EUA ao Conselho de Segurança.

O tempo nos dará as respostas, no momento prefiro observar mais o fenômeno, afinal como bom seguidor dos métodos de Karl Popper, primeiro eu observo o fenômeno, depois analiso e faço deduções, crio e testo as hipóteses, por isso mesmo esse método é chamado de hipotético-dedutivo. (E você achava que suas aulas de metodologia cientifica não serviam para nada, mas a verdade é que sem método sua análise vira caos).

Como sempre a cobertura das redes internacionais é infinitamente melhor que a feita pelos meios nacionais. A BBC e CNN exibiram bons vídeos e entrevistas com todos os lados e com altos funcionários (não o sub do sub do sub, como diriam alguns). Outro aspecto interessante será observar se o Brasil e a Turquia usarão esse incidente para empurrar sua ofensiva diplomática na região. O tal “acordo” nuclear com o Irã.

PS: Para conferir as notas oficiais e clipping de informações visite o blog do colega de “profissões” (blogueiro e bacharel em relações internacionais) Daniel Cardoso Tavares, de quem eventualmente posso discordar (coloque dois bacharéis em relações internacionais juntos e veja se concordarão em tudo), mas não posso deixar de reconhecer que ele faz excelentes clipings de notícias internacionais e notas a imprensa de vários órgãos. O blog é o política externa. Quem achar que o trabalho lá levado a cabo é digno vote neles para o prêmio TOPBLOG.

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