Não é novo o imbróglio entre Brasil e Paraguai sobre o preço da energia não usada pelo Paraguai e comprada pelo Brasil, por conta do tratado que possibilitou a construção da Usina Bi-nacional de Itaipu, uma passada d’olhos em jornais paraguaios nos dão noção de quanto a Bi-nacional é importante para o país Guarani, que dá ampla cobertura as ações da diretoria, por sinal o nome do diretor da empresa é sempre alvo de debates e conhecido, mais até que o nome do presidente da Petrobras aqui no Brasil.
Politicamente Itaipu se mostra muito importante para o debate público e porquanto para a opinião pública do país guarani. E isto, como já escrevi aqui em outras ocasiões, complica muito a negociação, pois diminui consideravelmente a margem de manobra dos paraguaios além de que seus líderes se vêem obrigados por suas próprias plataformas eleitorais a demandarem revisões difíceis de se concretizar ante o Brasil, que pretende sempre que possível honrar os termos do Tratado de Itaipu, sendo bastante avesso a revisões nesse sentido.
Contudo, a questão com o Paraguai é maior, pode-se argumentar que historicamente há setores nesse país que se valem das atrocidades e da veemência do desfecho da Guerra do Paraguai para se arrogarem o papel de vítima do imperialismo brasileiro, nesse sentido seria o Brasil, suas ações na região e a infiltração de brasileiros em seu território a raiz de todo atraso e de toda pobreza no Paraguai.
Posso estar a exagerar um tanto o alcance, mas não é difícil de ver esse sentimento anti-brasileiro, que não só permeia a questão de Itaipu, como se espalha por todos os aspectos do relacionamento entre os dois estados que incluem questões como as dos “sacoleiros” da ponte da amizade, do contrabando de armas, drogas e produtos falsificados. Dos crimes fiscais, como lavagem de dinheiro, que colocam a região de tríplice fronteira até no radar das agências de inteligência que se ocupam do que se convencionou chamar de “guerra ao terror”, afinal os mecanismos criminosos do tráfico internacional são um know-how aplicado a todo tipo de atividade criminosa ou clandestina.
E está ai a raiz da complicação atual na intersecção entre cooperação necessária em segurança, discursos e promessas de integração regional (muito além da econômica, dizem os políticos) e a tensão latente entre grupos que se costumam intitular “excluídos” e os brasileiros e seus descendentes, conhecidos como brasiguaios. Isso tudo se misturou explosivamente nos últimos dias na esteira do atentado ao senador Robert Acevedo, político que era ativo na denuncia de grupos de traficantes que se transvestem de grupos guerrilheiros. Esses grupos são ligados não só a grupos colombianos (que por sua vez se conectam as maras da América Central, aos cartéis que dilaceram o México e abastecem a rede de distribuição nos EUA e Canadá), mas a grupos e facções criminosas brasileiras, como o infame Primeiro Comando da Capital – PCC e o Comando Vermelho – CV.
O levante dos criminosos paraguaios levou o combalido Presidente paraguaio o ex-bispo católico (portanto um trânsfuga) Fernando Lugo (sim, aquele mesmo que levou muito a sério a demagogia de pai do povo) a afirmar seu poder e sua firmeza decretando Estado de Exceção [para entender melhor isso recomendo esse artigo do blog parceiro Caos-RI] o envolvimento de brasileiros no crime não surpreende dado os laços documentados entre os criminosos dos dois países, mas está acirrando o preconceito e a perseguição aos brasiguaios, segundo os jornais, já há cidades de fronteira aventando a possibilidade de decretar estado de emergência para conseguir lidar com afluxo de refugiados brasileiros, que retornam ao Brasil, com pouco mais que a roupa do corpo, isso quando muito.
Não, não quero levantar sentimentos patrióticos que seriam complicadores da resolução dessa crise é hora de diplomacia, de uma diplomacia firme, mas serena, sem a pressão de lidar com assunto como se fosse de orgulho nacional, o que diminui sobremaneira a margem de manobra dos negociadores.
O Presidente Lula se reuniu com Lugo na fronteira e ressuscitou o problemático projeto de construção de linhas de transmissão de energia, que aliviariam os apagões no Paraguai ao permitir que usem a energia de Itaipu, contudo, essas linhas seriam financiadas pelo BNDES, e como sabemos financiamentos públicos no Brasil, são terreno fértil para impropriedades e corrupção, ainda mais feito como está sendo feito, sem que os órgãos de controle externo tenham demonstrado capacidade de fiscalizar o uso desses recursos dos contribuintes brasileiros em terras externas.
Alias, semana passada se encerrou o prazo de entrega das declarações anuais de ajuste do imposto de renda, muitos brasileiros sentiram a mordida do leão, e é deles que provem o dinheiro usado pelo governo, por isso transparência e debate público deveriam ser a norma.
Não é segredo que algum peso da integração regional recairia sob as costas do achacado contribuinte brasileiro, contudo, é razoável esperar que isso se reverta em ganhos para o Brasil, portanto, qualquer ação nesse sentido de investimento direto por parte do governo em outro país deve ser pautado em benefícios tangíveis aos brasileiros, por exemplo, ceder na questão financeira ao Paraguai deveria ser seguida de exigências, como de maior controle das fronteiras, maior cooperação em assuntos como evasão de divisas, descaminho, receptação de carros roubados e as questões de tráfico de drogas.
Isso pode soar como políticas imperialistas, mas é apenas uma manifestação da defesa do interesse nacional, e daria algum espaço para o aliado de esquerda do governo Lugo posar de homem forte. Por que senão isso estaria o contribuinte brasileiro financiando o desenvolvimento paraguaio a condições de “pai para filho”, sem receber nada em troca, nem mesmo a mera diminuição da retórica anti-brasiguaios.
Será, mais uma vez o contribuinte ser chamado a pagar a conta de belas palavras de um líder político auxiliando um aliado? De todo modo a cooperação com o Paraguai é necessária, com engajamento brasileiro ativo, afinal um líder regional não pode permitir que um país vizinho, aliado e sócio em um projeto de integração tenha sua institucionalidade ameaçada por criminosos, por traficantes de drogas e armas, pessoas que são a meu ver o ponto mais baixo da humanidade. (ih, a turma politicamente correta não vai gostar!!!).
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