Assista primeiro ao vídeo da entrevista do Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que tratou de Irã, defesa comercial e gafes, concedida a jornalista Miriam Leitão.
Imagino quão difícil deve ser a vida dos diplomatas nos atuais momentos, imagino aquele terceiro-secretário, aprovado em um duríssimo processo seletivo, que passou dois anos estudando e trabalhando duro no Instituto Rio Branco e agora por respeito a hierarquia funcional, tem que por seu estudo, seu intelecto a serviço de um trabalho de justificação de uma ação que claramente não surtiu os efeitos desejados e que tenta ser “salvada” pelo menos no campo midiático. Imagino que para alguns deve ser bastante frustrante se ver compelido a servir mais aos interesses de grupos partidários e ideológicos do que o Estado, afinal, ao menos em tese, quem quer ser diplomata, quer servir ao Estado.
Deixando essa digressão de lado vamos a entrevista. O Ministro como vimos faz um esforço enorme para mostrar que a posição brasileira foi de protagonista de uma vontade manifesta do mundo ocidental, em busca de um broker, para lidar com o Irã. E que por isso o Brasil, não estaria isolado na defesa do Irã, estaria sim, agindo de acordo com seu mandato de membro não-permanente do Conselho de Segurança ao trabalhar pela paz.
Para reforçar essa posição na mídia, foi “vazada” (construção verbal horrível, eu sei) a carta de Obama, como uma defesa da posição do Brasil, que não teria agido sem o conhecimento do P5, seria na verdade seu porta-voz, uma mudança do discurso da diplomacia altaneira e que não se submete as potências que vinha sendo advogada na imprensa.
Contudo, o encadeamento dos fatos contradiz o Ministro já que a Declaração de Teerã foi vaga, não criou confiança, como ele quer passar, já que as próprias autoridades iranianas se asseguraram em garantir que continuariam a enriquecer Urânio. Que é o fato que cria a desconfiança da comunidade internacional, uma vez que a República Islâmica impõe dificuldades para ação dos inspetores da AIEA, tanto que foi essa Agência do Sistema ONU que pediu por uma nova rodada de sanções.
O Brasil empenhou muito de seu prestigio na hipótese de conseguir ser o mediador da questão iraniana, seria uma grande vitória, que seria conquistada graças ao status internacional do Brasil, sua competência técnica e liderança de um presidente que seria o estadista, “the man” (ou Da man, já que Obama é “so cool”). Mas, para isso seria necessário não qualquer acordo e sim algo realmente significante, era preciso um fato novo.
E não foi o que o Brasil conseguiu, o Itamaraty conseguiu uma declaração parcial, que não demonstra boa-vontade, já que não oferece no mínimo uma moratória no enriquecimento de Urânio, a quantidade do minério também, não sofreu um ajuste entre a oferta inicial do acordo e o seu aceite.
Os principais líderes mundiais viram o engenho tripartite como mais uma manobra dos hábeis diplomatas iranianos, para ganhar tempo. E o alerta quanto a isso já estava no texto deselegantemente vazado.
Sobre isso já escrevi inúmeros textos, desta vez fica claro aqui a posição do ministro, o que seria uma espécie de ouvir o “outro lado” desse blog. Embora, que fique claro, eu não sou jornalista, nem tenho pretensões de o ser, sou analista de relações internacionais.
Como já disse inúmeras vezes meu trabalho não elogiar, por elogiar, nem criticar, por criticar. Minha missão, minha ambição é analisar e nesse sentido vale um elogio a forma como o mesmo Itamaraty lida com as questões comerciais, embora, nesse âmbito outros órgão governamentais são intervenientes importantes, além dos grupos associativos dos empresários que prestam papel importante no sistema de defesa comercial. Nesse particular a estratégia de negociações bi-laterais com os EUA são importantes para que o consumidor brasileiro não seja prejudicado por meio da aplicação das medidas compensatórias (que muitos gostam de chamar de retaliação).
Escrevi uma monografia sobre o tema e também li teses de doutorado e muitos livros e nas conclusões da minha referida monografia apontava um dilema que surgiria da vitória brasileira na OMC. Este dilema se manifesta na forma em que mesmo ganhando na OMC a legislação agrícola dos EUA, (Farm Bill) tem uma inércia enorme e que nem as medidas compensatórias conseguem romper, portanto seria necessário buscar mecanismos para conseguir vantagens comerciais.
Uma das opções seria sacrificar o setor cotonicultor por concessões em outras áreas, como por exemplo, nos componentes com tecnologia norte-americana nos aviões da Embraer, com permissão para exportações, essa opção serve para ilustrar quantas forças estão envoltas na questão comercial, por isso a prudência é o melhor caminho, não é lócus em que arroubos de patriotada sejam apropriados.
Por sinal, essa aventura e insistência de posar para fotos ao lado de líderes antiamericanos como Ahmadinejad, Chávez e outros, não ajuda o trabalho dos que fazem lobby pró-Brasil junto ao congresso americano. Esse é um exemplo do que eu chamo de gastar energia em assuntos pouco vitais para o Brasil, que atrapalham os que são.
Quanto à história do ministro perdido pela Calle Florida em Buenos Aires, é uma história deliciosa, muito bem narrada no blog – Os Hermanos – do correspondente, Ariel Palácios, uma anedota interessante, que poderia servir para proselitismo barato como o que foi feito com os sapatos de outro ministro. Imagino o Sr. Ministro e seu séquito, acompanhados por jornalistas, ouvindo os incessantes apelos dos vendedores de artigos de couro e os pedidos de esmolas que assolam essa rua que me desperta muitas lembranças.
Não vou cobrir aqui ponto por ponto da entrevista, mas é bom que pelo menos a jornalista que eu não tenho muita simpatia tenha feita perguntas duras, ainda que com respostas vagas, como convém a um Ministro de Estado, tratado de política ativa. Embora demonstre irritação com a não exaltação de seus atos, tal qual Dunga, em “diplomatiquês”, mas com o mesmo viés.
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