Publicado com atraso devido a situação de plano B, que perdura nesse blog.
Quem já teve o enorme prazer de visitar a bela capital da República Argentina, a famosa Buenos Aires, e mesmo quem não foi, sabe que a praça enfrente a famosa Casa Rosada, leva o nome de praça de maio, em alusão ao movimento de independência liderado pelo venerado San Martin (cujo corpo se encontra enterrado em área anexa a Catedral Metropolitana, um dos belos edifícios que cercam a praça). Há nessa praça um pequeno monumento em que se lê 25 de mayo de 1810. A dada que marca o inicio do processo que culminaria na independência dos “hermanos”.
Já havia planejado escrever algumas linhas sobre isso, quando vi esse texto no blog – Os Hermanos – do jornalista argentino, correspondente em Buenos Aires para vários veículos da imprensa nacional que transcrevo agora. Hesitei quando vi que Paulo Roberto de Almeida o fez em seu – Diplomatizzando – ao invés de pensar nisso como uma espécie de cópia desse autor, prefiro (com alguma dose de wishful thinking) ver isso como um daqueles episódios em que grandes mentes pensam parecidamente. Não transcrevo na íntegra. Recomendo que leiam esse texto lá e o de hoje todos com a deliciosa ironia que sabemos ser uma das marcas da imprensa argentina e de muitos argentinos.
Resumo da opereta
O Teatro Colón, a maior sala de ópera da América Latina (que segundo especialistas da lírica, conta com a melhor acústica para o gênero), será reinaugurado nesta segunda-feira à noite. Ainda não abriu suas portas e já é o foco de uma disputa digna de uma opereta de Franz Léhar ambientada em um inventado país dos Bálcãs.
Cristina Kirchner, irritada com o prefeito Maurício Macri, não irá à principal festividade das celebrações do dia 25 de maio, a data nacional, no Teatro Colón, símbolo da cultura argentina.
Por outro lado, a presidente não convidou ao banquete da terça-feira o vice-presidente Julio Cobos, com quem está brigada desde que ele, que também ocupa a presidência do Senado, votou contra o governo em 2008. O banquete será na Casa Rosada, o palácio presidencial.
De quebra, a presidente Cristina tampouco convidou os ex-presidentes argentinos ainda vivos desde a volta da democracia, em 1983.
O país contará com celebrações paralelas para o Bicentenário: a presidente Cristina, com o banquete na Casa Rosada e um Te Deum em Luján, o prefeito Macri com sua gala no teatro Colón; o cardeal Bergoglio com um Te Deum na catedral portenha, e até o governador de San Luis, Alberto Rodríguez Saá, que construiu uma réplica do Cabildo de Buenos Aires (edifício que foi o foco da Revolução de Maio) para fazer seus próprios festejos.
O Bicentenário argentino, longe de mostrar unidade política, exibe um país profundamente dividido, sem fatores externos que causem as divergências.
O colunista político Adrián Ventura, ironizou com amargura: “talvez no Tricentenário não estaremos pior do que agora…”
Personagens
- Cristina Kirchner, presidente, que chegou à Casa Rosada em 2007 como sucessora do próprio marido. Seus críticos afirmam que comporta-se como fosse uma diva de ópera.
- Mauricio Macri, prefeito de Buenos Aires, opositor dos Kirchners, ex-presidente do Boca Juniors e filho do empresário Franco Macri (o pai de Macri, por seu lado, é enfático simpatizante dos Kirchners desde 2004).
- Néstor Kirchner, ex-presidente (2003-2007), marido da presidente, secretário-geral da Unasul, presidente do partido Peronista e considerado o verdadeiro poder dentro do governo da esposa.
- Julio Cobos, vice-presidente que rachou com a presidente Cristina em julho de 2008. Considerado “mosquinha morta” quando foi escolhido para o posto de vice (Kirchner o escolheu para ser vice da esposa), agora é “presidenciável” da oposição. Macri não gosta dele, pois o prefeito portenho também ambiciona ser candidato da oposição nas eleições presidenciais de 2011.
Cenários: Teatro Colón, Casa Rosada, residência oficial de Olivos, prefeitura portenha.
Época: Os dias prévios ao 25 de maio de 2010. O 25 de maio é a data nacional, o dia da Revolução de Maio de 1810, quando iniciou o processo de rebeliões e guerras que levaria à independência do país em 1816. Na terça-feira que vem a Argentina celebrará o Bicentenário da Revolução de Maio. A data está gerando uma série de debates na sociedade sobre os acertos e os erros do país ao longo dos últimos 100 anos. O quiproquó político dos últimos dias deu um toque amargo às reflexões sobre o futuro da Argentina.
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ANÁLISE DA OPERETA: Os analistas políticos criticam a decisão da presidente Cristina. E tampouco poupam Macri de críticas. A socióloga Beatriz Sarlo, no artigo “Brigas que carecem de grandeza” publicado neste sábado no jornal “La Nación ”, indica que “não era previsível que ao chegar ao balanço do bicentenário estivéssemos ocupados com brigas cujos motivos carecem de qualquer exemplo”.
Segundo Sarlo, a frase de Macri sobre Kirchner (sobre sentar ao lado dele) é uma demonstração de que o prefeito portenho “acredita que pode comportar-se como se fosse o pai de uma namorada cujos sogros não lhe agradam”.
Sarlo sustenta que ele, falando como chefe de governo de Buenos Aires, não deve declarar que não está contente em receber o marido da presidente no dia 25 de maio no Colón. “Ninguém lhe pede que diga que sentar ao lado de Néstor Kirchner seja seu sonho. Ninguém lhe pede que exagere um tom amistoso que não sente..simplesmente, um político em funções de governo cala a boca”.
Sarlo também critica a presidente Cristina e diz que ela só não vai ao Te Deum na catedral para não encontrar o cardeal Bergoglio ali.
Segundo Sarlo, os motivos destas atitudes “que seriam caricaturescos se não afetassem a vida pública, tem a ver com o pior lado do estilo político nacional”.
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