A decisão de acionar as medidas compensatórias não é uma decisão que seja irreversível, como muitos especialistas declararam as várias redes de televisão e para os jornais. É uma ferramenta de pressão que visa diminuir o poder do lobby grassroots da agricultura americana.
Esse tipo de lobby é particularmente difícil de enfrentar por que ao contrário da pressão feita em gabinetes que sempre é mal visto pelas pessoas esse tipo de lobby movimenta as comunidades interessadas de um modo muito similar aos movimentos sociais, ou seja, se tornando uma causa. Esse tipo de levantamento une os produtores rurais em um bloco coeso, sejam eles grandes ou pequenos produtores que por sua vez exercem grande pressão em seus distritos, exigindo dos congressistas medidas de apoio. Ao mesmo tempo financiando aqueles políticos alinhados as suas demandas (não importa se alinhamento “de coração” ou “interesseiro”).
O Brasil tem suas mãos nesse momento boas oportunidades de barganha por força das condições econômico-políticas nos EUA que colocam em cheque a capacidade desse governo de financiar sua divida pública havendo um clamor por austeridade fiscal. Esse clamor, por sinal, tem sido um grande desafio para a aprovação da reforma do sistema de saúde proposto por Obama. Os movimentos conservadores têm usado o discurso da austeridade de maneira ostensiva e esse discurso foi em parte adotado pelo recém eleito Senador Scoot Brown. Nesse caso um prejuízo a setores produtivos pode ser associado a ação governamental e a pressão pode vir de um entendimento que os subsídios dão duplo prejuízo ao serem caros para o contribuinte e ao impedirem as empresas de exportar para o Brasil, gerando empregos (tão necessários) e renda que ajuda a mitigar os efeitos da crise.
Embora esse cenário seja possível é wishful thinking crer que a ação não terá repercussões que podem travar ainda mais a agenda bilateral que avançou recentemente, é verdade, com acordo tributário para prevenir a dupla tributação, um avanço que é a muito esperado pelos empresários dos dois países. Interessante notar que o Brasil conseguiu que Medidas Compensatórias cruzadas o que pode ser bastante eficaz para provocar a negociação, já que assuntos relativos ao GATS são muito sensíveis entre as autoridades e empresariado dos EUA.
O episódio é uma ótima demonstração de política externa que dessa feita não está escolhendo um caminho áspero ao largo do interesse nacional, essa disputa agrícola está no cerne do que considero como núcleo do interesse nacional que é a busca por meios que viabilizem o desenvolvimento sócio-econômico do país. E isso é uma diferença enorme de se opor aos EUA por motivos de solidariedade ideológica.
Além de ser uma disputa pragmática para cessar os danos aos produtos nacionais há ainda uma questão de princípio que é o livre comércio, esse princípio norteia o sistema multilateral de comércio. E a agenda multilateral é ponto fulcral da diplomacia brasileira bastante atuante nas negociações em Doha.
Claro que as medidas anunciadas trarão algum prejuízo aos consumidores que têm o hábito de consumir produtos americanos e os importadores e lojistas que os revendem que terão preços mais altos e a depender da elasticidade do produto terão uma redução do volume. Contudo, é o preço do processo e arriscando soar fatalista alguém terá sempre que pagar o preço.
Por isso mesmo medidas compensatórias são tão raramente utilizadas são uma ferramenta de barganha, ou seja, são utilizadas para pressionar e obrigar aos negociadores que sejam criativos e encontrem acordos. O lado negativo é que a própria natureza dessa negociação não garante que cessem os danos provocados pelos subsídios ilegais já que não raramente a solução encontrada é oferecer vantagens em outros setores em que as mudanças de legislação sejam mais fáceis de alcançar.
É provável, portanto que o setor algodoeiro não consiga se livrar dos efeitos nocivos das medidas que apresentei em posts anteriores, por isso mesmo pressionam para que o MDIC e o MRE não deixem de atuar no sentido de que cessem os subsídios. Como tudo em relações internacionais interesses conflitantes norteiam as questões.
Reitero que o caso do algodão a atual postura do governo brasileiro são exemplos de profissionalismo e integração dos setores produtivos e o governo. E nesses dias em que analistas nacionais e estrangeiros afirmam que o apoio ao Irã demonstra a elevação da autoestima da diplomacia nacional é revigorante ver que a diplomacia pode ser independe e altiva sem ter que se ver isolado do mundo apoiando regimes duvidosos, para dizer o mínimo. Como sempre nos resta agora aguardar os próximos passos que serão dados ou com sucesso da negociação ou com a implementação das medidas compensatórias.
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