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Domingo de leitores

Aos domingos costumo responde a e-mails de leitores, em sua maioria as questões são sobre o curso, mais especificamente sobre empregabilidade. Essa semana foi particularmente profícua em questionamentos.

Responderei por ordem de chegada e assim o primeiro será um que aborda uma situação comum em muitas famílias que a dificuldade da família em lidar com a opção universitária do jovem. E a pressão que os pais aplicam para que o filho opte por uma carreira tida como tradicional na qual há uma teórica maior possibilidade de obter segurança financeira. Importante notar que essa pressão na maioria dos casos se dá de boa-fé.

Diz-nos o leitor “[...] ouço de meu pai, que se preocupa com o futuro que eu possa ter nesse curso, fala que o mercado de trabalho não é muito favorável, que é um "curso da moda" atualmente e que será passageiro.” E continua “De fato, pelas fontes que obtive, o mercado de trabalho brasileiro está carente de profissionais desse curso, tenho um amigo que estuda na UEPB e cursa RI (ainda está no primeiro período) que me disse que nenhum dos professores é realmente formado em RI, alguns de economia, outros de direito, sociologia, e assim formou-se o corpo docente da universidade.”

Bom seu pai não está de todo errado na questão em que o mercado é restrito há muito desconhecimento acerca do curso e de que esse profissional pode fazer, nesse sentido recebi outra solicitação parecida de uma estudante que já está em fase final de curso que pretendia estagiar em consultorias, mas se deparou com o mercado restrito. Existe é claro várias possibilidades de obter emprego em empresas de serviços (empresas de comércio exterior, consultorias), empresas industriais (exportadoras ou importadoras de insumos), no governo em todas as esferas e em vários órgão e no terceiro setor em associações comerciais, câmaras de comércio, grupos de ‘advocacy’ (ai se incluem organizações tipo Green peace) e há oportunidades na academia, já que é infelizmente comum que haja falta de professores de relações internacionais fora dos grandes centros.

Mas, esse cenário de várias possibilidades não significa que será fácil e que melhorará em breve, apesar da necessidade ser palpável mudança nos empregadores levam um bom tempo e não quero alimentar sentimentos de facilidade que poderão ser contrariados pela realidade. Para diminuir essa dificuldade há os cursos de pós-graduação, mas nem isso é garantia.

Em termos de emprego público, quase todos os concursos que não exigem formação especifica oferecem vagas que podem ser ocupadas por bacharéis de relações internacionais. Por exemplo, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal têm concursos com vagas para relações internacionais. O ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio – MDIC. Oferece várias carreiras de analistas. A APEX-Brasil, Agência de promoção de exportações e investimento, também. A ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, e todos os ministérios e principais organismos. São concursos e aprovação será difícil e exigirá muito, mas muito esforço e dedicação.

Emprego no setor privado dependerá de seu currículo e do perfil das empresas na área de atuação em que você esteja disputando, ainda mais por que há um numero relativamente grande de egressos universitários de todos os cursos desocupada e disputando essas vagas. Assim as preocupações do pai do leitor são compatíveis com a realidade. Sou compelido a dizer que apesar d’eu ser um ardoroso defensor do planejamento e da preparação, ou seja, sabendo que será difícil se preparar para transpor a dificuldade, sei por experiência própria e por relatos de vários que tentar planejar a vida com anos de antecedência é contraproducente no sentido que a vida sempre reserva mudanças e não dá pra saber antes de estudar o que lhe despertará o prazer em trabalhar. Posso dizer que não obstante sua escolha profissional será o prazer na profissão que lhe dará a garra para ser um bom profissional (por que isso exige muitos anos, décadas até de dedicação e por isso mesmo vai muito além dos 4 anos de universidade).

Outro leitor me faz um belo e complexo questionamento, nas palavras dele “moro em uma cidade onde o curso não é muito conhecido e por conseqüência, não conheço profissionais de área, nem um pouco da atuação desses profissionais na prática. Por exemplo: se eu escolhesse o ofício da medicina, iria a um hospital e veria como é a rotina dos médicos. Então, minha pergunta é: como posso fazer algo semelhante com Relações Internacionais, como posso ver na prática o ofício do “Internacionalista”?”

A miríade de ocupações possíveis torna essa medida que você pretende bastante difícil por que cada tipo de autuação exige uma rotina diferente. Darei exemplos de como eu atuo.

Sou como está em meu perfil consultor, isto é, ofereço know how para empresas e empreendedores, eu vendo meu conhecimento, nesse sentido meus contratos contêm clausulas de confidencialidade que objetivam proteger meus métodos e os números e dados de meus clientes. Algo muito comum. Por isso falarei de maneira genérica. Meu processo produtivo começa quando tenho uma reunião com o cliente para definir o que ele precisa, digamos que ele queira um plano de exportação. Que é um documento que contém todos os elementos que nortearam a exportação (no caso desse exemplo) da empresa.

Começo aplicando questionários e visitando a fábrica e os escritórios do cliente levantando as potencialidades, a partir daí definimos a capacidade da empresa. Minha rotina seria ler os questionários, tabular resultados, interpretá-los. A partir daí ter um retrato completo do ambiente interno da empresa. Uma vez definido o produto que será comercializado. Definiremos o mercado chave onde faremos o projeto piloto dessa empresa, definindo como será feito, por que meios, selecionando parceiros, treinando pessoal da empresa, calculando custos da operação, analise de riscos e custos do mercado em vista (tudo isso será aprendido no curso ou em atuação comercial), troca de e-mail e telefonemas com os parceiros, estratégias de negociação, busca de informação.

Em resumo minha rotina é debruçada em números e dados, preso na rotina do escritório, definindo estratégias, traçando planos que devem ser aprovadas e implementadas por terceiros, portanto precisam ser bem explicadas e comunicadas no plano de exportação (que é um plano de negócios especifico). Uso métodos de gestão de projetos para acompanhar todas as etapas. (ficou parecendo comercial, me desculpe).

Eu tenho plena ciência que isso não irá aplacar suas dúvidas e recomendo que você continue a buscar por outros exemplos. Meu objetivo foi dar uma idéia de como é o dia-a-dia, que é em resumo estudar, aprender e transmitir o que foi aprendido.

Deixo um recado a todos, enumero as dificuldades para que se preparem e tomem decisões conscientes, mas saibam que apesar delas amo o que faço. E que como diz o escritor e consultor de carreira e inovação Daniel Pink: persistência vence talento. Ou seja, de nada adianta aptidão se você não trabalhar (estudar) duro.

Não deixem de ler toda a guia FAQ, por inclusive há uma descrição melhor da rotina de trabalho por lá. (alguns textos estão com a formatação corrompida pela mudança de layout, corrigirei em breve, por enquanto minhas desculpas). Espero ter ajudado e muito obrigado pela visita de vocês e suas correspondências.

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