Sim hoje é dia da bandeira. Sim esse é o hino a bandeira. Não esse post não tratará do Pavilhão Nacional, nem será uma ode ufanista patriótica. O trecho, talvez o único difundido, do referido hino, bem que poderia ilustrar uma histeria primária que arrebatou o mundo irradiando a partir dos EUA, amplificada pela imprensa mundial e calcada num desejo sincero ainda que em certos casos irracional de mudança que elevou um jovem político semi-desconhecido, com uma oratória impressionante é fato, ainda que sem definições claras.
A arrebatadora reação do mundo ao então candidato Barack Obama se deveu não só a seu excelente uso da publicidade política (há quem chame de marketing), que enfatizou um homem de uma imagem sedutora, advogado brilhante formado pela mística Havard, jovem plenamente conectado ao modo de se comunicar do mundo virtual, mas também aos anos George W. Bush figura repudiada pela grande imprensa e que por falta de carisma conseguia ser criticado até quando defendendo posições acertadas.
A imagem de mudança é sempre arrebatadora seja aqui, seja nos EUA, seja em qualquer lugar onde eleições existam. A grande indagação que pairava era qual seria a real extensão da mudança? Nos primeiros momentos de seu governo o Presidente Obama se referiu à política externa como um petroleiro em que a mudança de rumo é lenta e difícil. Particularmente verdadeiro para um Estado em que o poder do congresso (logo dos interesses locais dos distritos que elegem os congressistas e senadores) tem influência capital ao limitar a liberdade de ação do líder do executivo.
Claro que o “caso de amor” da grande imprensa com a figura mítica do cavaleiro que viria salvar o mundo (havia e há uma corrente que via na eleição de Obama uma espécie de punição aos Estados Unidos pelo fato dele ser negro em vista do racismo local. Um paradoxo já que ele o elegeram, não é?) impediu que se conjecturasse com profundidade sobre a política externa de Obama, ainda que com um ano seja em grande parte indicativa. Ao olharmos a cobertura e até as análises de muitos colegas vemos uma tendência de qualificar tudo que o mandatário americano dizia de histórico.
Isso retirou a objetividade já que na prática temos dois ‘Obamas’ o Presidente dos EUA, Democrata de Chicago e o Obama o mito. Esse segundo prejudica muito a avaliação do primeiro por que o sobrecarrega de todo o tipo de expectativas sobre suas ações.
Essa semana tivemos exemplos práticos disso. Primeiro a queda nos números de aprovação de Obama, segundo uma desilusão aberta quanto às posições de Obama e do Presidente Chinês sobre metas de emissão, uma bandeira comum entre os entusiasta de Obama, terceiro a não-participação do mandatário na Cúpula da FAO e por ultimo a admissão do que já era esperado e previsto desde o anuncio da medida, da impraticabilidade de se ter um dead line para o fechamento da controversa e emblemática prisão da base de Guantánamo.
Cheguei a testemunhar em um programa da Globo News um comentarista concluir com um certo pesar na sua voz que Obama é acima de tudo presidente dos EUA e se pauta pelos objetivos e interesses de seu país. Uma constatação do óbvio é claro, mas é emblemática de como o arrebatamento do Obama mítico supera a racionalidade, de profissionais de bom senso.
O premio Nobel da Paz dado a Obama é a meu ver é quintessência da dissociação entre o Obama mítico e o Obama real, já que deram esse premio a Obama com base em seus históricos discursos em nome da paz e pelo seu simbolismo de primeiro presidente negro dos Estados Unidos e não pautado em ações concretas.
Ainda que seja vacilante, como mostra demora em tomar uma ação em Honduras, a presidência Obama e sua política externa tem se conduzido em eixos que já esperava muito próximos ao tradicional modo democrata de governar, ironicamente sem apresentar nenhuma mudança, por sinal, tudo dentro do esperado.
Esse texto como já foi percebido não se aprofunda em discussões sobre as concepções de política externa que atualmente regem o governo dos EUA, uma linha de analise sem duvidas interessante, principalmente se analisados contrastes ou não entre as noções de excepcionalidade americana e mesmo a guerra ao terror que reaparece no eixo das relações externas dos EUA.
O objetivo desse texto, como também, já ficou claro é demonstrar como as escolhas feitas ‘aprioristicamente’ influenciam e até mesmo “contaminam” os resultados da análise. Nesse caso a projeção da imagem cultivada durante a campanha conduziram analistas e a pessoas em geral a expectativas irreais sobre as ações do presidente Obama. O contrário, também, é verdadeiro logicamente. Uma vez que imagens a priori negativas sobre o presidente conduzem a analises igualmente enviesadas.
A meu ver a pressão de carregar um mito pode influenciar a tomada de decisão do presidente Obama que tenta capitalizar seu carisma em ganhos políticos, essa operação de conjugar real e mítico, imagens e políticas concretas é o desafio pessoal de Obama e o desafio estratégico do Departamento de Estado e pode ser essa busca de equilíbrio que faça o mandatário dos EUA parecer vacilante.
Os próximos meses devem fornecer mais pistas sobre os rumos reais da política externa americana. E de como será de fato a presidência Obama, destinada ao que parece a ser histórica, antes mesmo de começar.
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