Liberdade de expressão. O termo em si é carregado de simbolismo que carrega consigo de períodos históricos mais longínquos que nos remetem a invenção de prensa de tipo móveis que permitiu a cópia e disseminação rápida de informações, dando uma publicidade inédita as idéias.
Em tempos mais recentes o termo empunha o simbolismo da reconquista da liberdade após períodos prolongados de sombras ditatoriais e autocráticas na América Latina, no Leste Europeu, na península Ibérica. O direito de expressão amplamente difundido nas revoluções burguesas retornava como bandeira de luta. No Brasil o fim da censura e sua proibição pela “carta cidadã” como se referia a Constituição Federal de 1988 o falecido Presidente da Constituinte e figura política emblemática Ulisses Guimarães.
O direito de expressão como todo direito não é absoluto no sentido que o próprio corpo constitucional o limita, por exemplo, vedando o anonimato. Ainda que como princípio abstrato da democracia seja inviolável por que o próprio cerne em que se sustenta qualquer regime democrático que se queira plural. Sendo nocivo e danoso ao ideal democrático qualquer relativização desse principio, por abrir caminho para que não haja dissidência ou mesmo para que haja censura.
As novas tecnologias romperam com as ultimas barreiras para o exercício da liberdade de expressão hoje qualquer pessoa que tenha acesso a internet seja em casa, no trabalho ou em lan houses (cyber cafés) pode se manifestar livremente sobre qualquer assunto. E são vários os lócus para isso, ainda mais com o crescimento das redes sociais, dos blogs e da maior interatividade que todos os grandes portais buscam ter. Isso sem contar a boa e velha página pessoal, grupos de discussão, grupos de e-mail.
Vivemos em uma sociedade que somos chamados a opinar todo tempo o que é uma benção duvidosa diriam os americanos por que por um lado nos permite exercer o direito humano fundamental de liberdade de expressão, por outro lado nos satura de informações incertas, inverídicas e muitas vezes baseadas no puro achismo, sem nenhuma base.
Outro fenômeno que chama a atenção, em especial, no mundo virtual é a virulência com que as pessoas tem se expressado principalmente quando confrontadas com o diverso, algo que sempre existiu na sociedade é verdade e está na raiz da violência política e não importa o espectro Che matava os inimigos do “povo” (na verdade da revolução) pelo mesmo motivo que Pinochet matava “subversivos” isso para ficar no século XX.
Não é raro nos depararmos com elementos que em debates usam de velhos estratagemas falaciosos que transformam um debate em arena para ataques pessoais. Há como sabemos inclusive grupos de indivíduos que se reúnem somente para atrapalhar discussões em fóruns ou comunidades virtuais, há casos de perseguição principalmente entre jovens o chamado “cyberbullying” e há ainda o extremo de grupelhos criminosos que marcam brigas e conflitos.
Claro que o abuso não tolhe o uso já diria um velhíssimo adágio e todas essas pequenas e não tão pequenas querelas são deformações do direito a expressão, verdadeiramente preocupante é quando a tentativa de intimidação da dissidência se torna organizada tolerada, incentivada ou protagonizada pelo Estado.
E são muitos os motivos alegados para limitar, regular a liberdade de expressão desde a defesa da honra e da privacidade até nacionalismos baratos e teses conspiratórias que invariavelmente miram grupos de mídia ou indivíduos que se opõem aos regimes no poder.
Há uma amplitude de ações desde a intimidação com poder econômico visando que determinada linha editorial seja alterada. Há uma crescente dificuldade de aceitar as diferenças de opinião ao mesmo tempo em que paradoxalmente a tecnologia estimula a proliferação de opiniões.
Nos últimos dias temos vistos diversos exemplos disso desde os banais como a falta de educação e grosseria de Maradona, “as pedras nas mãos” de Dunga, Murici Ramalho, Mano Menezes, como os mais graves como a briga declara dos Kichner com o grupo Clarín, de Barack Obama com a rede TV Fox News. Até por aqui tentativas de intimidação da imprensa tem sido cada vez mais comuns.
Ok, sei que liberdade de expressão embora similar não é a mesma coisa que liberdade de informação, mas os ferramentais usados para controlar o segundo são aplicados ao primeiro e só não são mais eficientes por que a internet dificulta muito a ação de censura ou patrulha organizada. Contudo, há a patrulha ideológica dos ativistas, daqueles ligados diretamente ou por afinidade a correntes de opinião que como disse acima não conseguem conviver civilizadamente com as diferenças de opinião, recorrendo quase sempre as falácias e agressões.
Essa situação piora quando o espaço para debate se quer cientifico. Todos os que dentre os leitores dessas linhas conhecem a evolução das ciências sociais, sabem que isso se deu por meio dos debates, das discussões acirradas sobre posicionamentos e interpretações teóricas, no caso das relações internacionais o peso e o impulso que esses debates deram ao avanço das linhas de pesquisa, das metodologias e conceitos empregados foram vitais para que a ciência se tornasse um campo do saber independente.
Os debates são importantes por que das críticas e das defesas de pontos de vista surgem os elementos que aprimoram o entendimento da matéria, já que muitas vezes os debates vão além da epistemologia e chegam ao campo da axiologia e da ontologia, ou seja, não são só sobre métodos e teorias como se apresentam mas seus fatores ocultos, as escolhas arbitrárias dos pesquisadores (axiologia) ou sobre a possibilidade de se vislumbrar a verdade por meio dessas pesquisas (ontologia).
E para que isso ocorra é fundamental que o debate se centre nas idéias e na sustentação lógica das mesmas e em determinar porquês de certas escolhas, sem que isso necessariamente, saia da esfera do debate e parta para ofensas e coisas piores. Na academia formal, a própria estrutura dos debates, defesas de teses, apresentações de papers por seu protocolo garantem o decoro é na arena da internet, que poderia e por vezes é subsidiário desses bons debates que as regras da civilidade e o respeito ainda que protocolar vão por terra.
Especulo que seja pela distancia entre os indivíduos já que os debates não se dão em auditórios ou salas de aula ou mesmo em artigos em revistas cientificas, mas sim diante de uma tela, desumanizando o debatedor, mas isso não posso concluir ou asseverar pois me faltam credencias em psicologia para afirmar algo assim.
A guisa de conclusão posso apenas reiterar que a liberdade de expressão é direito humano fundamental, principio democrático inexorável, que apresenta desafios e que é limitado e condicionado, como tudo, as leis vigentes, e acima de tudo é a liberdade de expressão a mais indispensável ferramenta do cientista, pois lhe permite dar publicidade a suas idéias e opiniões, que podem e até devem ser abertas ao escrutínio e ao contraditório. Sendo lamentável que inúmeras oportunidades de debate profícuo sejam desperdiçadas e por conseqüente desvirtuadas por causa de falácias principalmente as ligadas aos ataques pessoais (ainda que não tenha medo de uma boa briga intelectual prefiro a via da discordância educada sobre fatos e argumentos, mesmo não sendo sensível e dificilmente colérico diante do desrespeito ou ataque pessoal).
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