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América Latina, segurança ou insegurança. Um ensaio livre

Semana agitada no front das noticias internacionais desde o “close call” do seqüestro do avião das Linhas aéreas Mexicanas, que nos lembra que o terrorismo é real, tangível e vivo na América Latina, aliás, para colombianos e peruanos sabem muito bem disso, bem como as vítimas do atentado ao centro judaico da AMIA em 18 de julho de 1994 na capital argentina Buenos Aires.

E por falar nesse ultimo ponto o presidente venezuelano sempre na liderança da oratória da defesa do continente de potencias hostis, sempre a ver ventos de guerra, esteve com o líder iraniano, país que segundo autoridades argentinas, orquestrou, financiou e executou o fatídico ataque em Buenos Aires. Um desses muitos paradoxos que vemos na política externa, por que se Chávez condena os EUA, pela atuação de sua inteligência nos sucessivos golpes militares na região (por isonomia, deveria também, denunciar o envolvimento soviético em conspirações, revoltas, insurgências e por ai vai) é um imperativo lógico que ele repudie um regime que atacou e matou inocentes no continente.

Contudo, o fator que liga Venezuela ao Irã, não é só cooperação em petróleo e em energia nuclear, mas é ideológica é feita para reforçar um ponto retórico de afastamento dos EUA e não só afastamento como afronta vendida como um ato de valentia extrema, o que não é nem perto do que se passa. Galhardia seria não vender petróleo aos EUA, pelo menos a meu ver.

Esse movimento retórico é por vezes minimizado por nós analistas e exagerada pela mídia é um sintoma de uma disputa mais profunda que por sinal se revela em todas as cúpulas e nas compras militares da região, nas alianças estratégicas que vão se formando, ai incluso os laços não estatais, ou seja, os laços entre organizações da sociedade civil, movimentos sociais, correntes de opinião. Que criam sinergias transnacionais, mas também ameaças graves a segurança dos Estados da região.

Pergunto-me o que é mais grave o fato da Colômbia abrigar bases americanas? Ou o fato das potencias e candidatos a potencia regional não estarem eles a frente da ajuda a Colômbia no seu pesado fardo de enfrentamento fratricida? E mais seriam essas bases mais nocivas que governos que interferem diretamente em outros da região?

Muitos são os que denunciam um complô de esquerda o famoso e notório “foro de São Paulo” (posso estar destruindo minha carreira ao falar nisso, posso estar a receber nesse momento várias pechas e a criar inimigos ácidos e cruéis). Uma tese que muitos qualificam como ridícula, mas se levarmos em conta o método de análise de redes sociais é possível vislumbrar elementos de coordenação de política que levam mais em conta interesses ideológicos do que pragmatismos ou o sempre difuso e móvel interesse nacional.

Quer um exemplo? Apresento um recente a questão hondurenha e recusa em aceitar como legitimas as eleições que já estavam marcadas antes da deposição, isso pode evidenciar que o plano desses líderes está mais ligado a manutenção de quem segue suas orientações ideológica que o propalado respeito a Carta Democrática da OEA. Faltam evidencias claro que faltam. Mas há elementos suficientes para que essa tese mereça uma investigação cientifica, ainda mais por que há suposições teóricas que sustentam a existência desse tipo de organização informal e elemento como aferir como essas redes influenciam as diversas políticas nacionais.

Por que tratar esses assuntos remotamente correlatos em um mesmo ensaio? Por que tudo isso é parte da análise que se deve desenvolver ao tentar prever o cenário de segurança da região, para identificar as ameaças possíveis, criar hipóteses de emprego de força, usar da dissuasão e também por que interessa ao cidadão, os rumos políticos que os diversos partidos e setores da burocracia almejam para o país, em uma democracia é da contenda (ordenada no campo das idéias) entre essas forças que delimitam a visão que um país tem de si mesmo e de que atuação deveria ter, qual o seu papel no mundo? E a consciência dos custos desse tipo de atuação assertiva, como gosta de chamar o Chanceler Amorim.

Tudo isso é apropriado por nós interessados e iniciados no campo, mas essa discussão pertence à sociedade e creio que cabe a nós, a alguns ao menos, decodificar toda essa complexidade, gerando elementos para que o cidadão possa tomar uma decisão informada.

Ainda mais nas questões de segurança, que são complexas e muito menos óbvias que as conversas de bar, dão a entender. O leitor iniciado sabe que não toquei em nada mais que a superfície do assunto, não objetivo isso nesse ensaio, aqui estou expressando opiniões as mais livres possíveis, para variar um pouco da rigidez quase acadêmica com que esse blog é redigido.

Deixo todas essas questões para que vocês se inspirem a pensar nos desafios da segurança muito além de que avião é melhor ou líder tal é ou não confiável. Deixo com vocês esses desafios para um pensamento em vários níveis de análise. Tipo de pensamento que sempre somos chamados a ter ao atuar no mundo das relações internacionais.

Por último um conselho final, àquele de sempre, leiam bem os discursos, sejam céticos com cenários de fim de mundo ou com líderes salvadores da pátria. E pensem o que queremos e entendemos como segurança nacional, regional, e mundial.

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