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11 de setembro

Essa é uma data que já vivia na infâmia do bombardeio ao Palácio de La Moneda, em 1973, (ataque que depôs o Presidente Socialista do Chile Salvador Allende) mas atingiu sua conotação mais tragicamente infame naquela manhã do ano de 2001. Muito já se falou sobre isso, muito se tem analisado sobre o fenômeno do terrorismo e as políticas que foram implementadas no esteio do combate a esse.

É difícil abordar esse tema sem se ser frio e técnico em um dia que isso talvez não seja apropriado, contudo, difícil também, é o oposto não ser emotivo, piegas e repetitivo com frases clichê, dessas do tipo: “onde você estava quando soube?”.

No filme “Gangues de Nova Iorque” do renomado diretor Martin Scorsese, a personagem principal Amsterdan Vallon (interpretado por Leonardo DiCaprio), cita seu pai ao final do filme ao dizer que todos nascem do sangue da atribulação, como uma metáfora bem explicita ao nascimento da metrópole que dá título ao filme esses acontecimentos servem de pano de fundo da trama, mas que ao fim do filme acabam por definir o destino de todas as personagens. Uma analogia com o parto, que apesar de não muito inspirada serve para descrever o nascimento do Século XXI, naquela manhã de setembro de 2001.

É claro que ainda é cedo para avaliar que os eventos de 11 de setembro e principalmente os posteriores mudaram definitivamente algo no modo como o sistema internacional e as relações entre os atores que compõe esse se dão.

Do ponto de vista da ciência das relações internacionais houve um aprofundamento das linhas de pesquisa ligadas a segurança, cultura e religião. A agenda que era dominada pela pesquisa e pela constatação da crescente fungibilidade do poder econômico e por assuntos de integração regional, havia até uma tendência de estudos que se preocupavam com o papel do Estado Nação e da soberania, numa era em que dilemas de segurança estavam sendo resolvidos multilateralmente como nos Bálcãs. Muitos analistas percebiam uma tendência a diminuição da soberania nacional em troca de uma nova forma de soberania supranacional.

O tão denunciado e atacado unilateralismo do governo americano pós 11 de setembro mostrou que ainda há uma sobrevida do atual modelo de Estado-Nação, mas também, explicitou o maior desafio a esse modelo de soberania e jurisdição determinada geograficamente, que são as redes sociais de lealdade não vinculada a territórios, como os grupos terroristas, que já existiam e já eram analisados pela literatura, mas os trágicos eventos colocaram linhas de pesquisa e teóricas desse segmento em primazia.

Do ponto de vista da filosofia política e do direito os atentados e seus desdobramentos criaram perguntas que de certa forma sempre estiveram na agenda de pesquisa, mas agora com uma abordagem mais urgente diante da necessidade real, diante do caso concreto. Os desafios são exemplificados em perguntas como qual o limite de vigilância? O que seria ou não restrições as liberdades individuais? Se existe o antagonismo entre segurança e liberdade? Papel das forças de segurança? Como lidar com sociedades cada vez mais heterogêneas?

Do ponto de vista militar aumentaram as preocupações com a chamada guerra de quarta geração, preocupações tais como lidar com insurgentes? Quem são e como julgar terroristas? Como lidar com os fatores sociais e culturais que constroem o cenário onde esse tipo de comportamento é aceitável e até mesmo prestigioso?

Para muitos o 11 de setembro foi o marco inaugural de uma guerra total entre ocidente e oriente (aqui entendidos como civilizações cristã e mulçumana respectivamente) uma opinião rasa por que deixa de ver que o terrorismo não é fenômeno ligado a uma causa especifica ou um tipo de modo de viver especifico. Pensar desse jeito tem o perigo de mascarar as verdadeiras questões e por reforçar estereótipos ainda aumentar a legitimidade do discurso dos recrutadores.

Uma pergunta que me faço sempre que penso nesse assunto é que passados oitos anos do atentado estão a Al Qaeda e seus apoiadores mais pertos de concretizar seus objetivos estratégicos? A resposta que me vêem é negativa, mesmo com a invasão do Iraque gerando suporte para a causa ‘jihadista’, continua a presença americana da Arábia Saudita, a qualidade de vida dos palestinos nos territórios autônomos e nas áreas ocupadas por Israel está pior que nunca, e o avanço dos “modernismos” dentro do Islã continua irrefreável, em todos os países islâmicos.

Há uma vitória estratégica que os radicais obtiveram o entendimento está longe e a violência continua a criar o meio de cultura de ódio, falta de perspectiva, laços familiares fracos que alimentam o fanatismo, o desejo de pertencer a algo maior, de servir a seu povo que sofre “injustamente” (ou sofre mesmo, mas o meio como isso é manipulado é o que importa), sentimento de revanche, de vingança que é bem explorado para criar terroristas.

Isso tudo catalisado pelos erros estratégicos do governo Bush e pela tolerância da chamada comunidade internacional com discursos inflamatórios e a falência de governos em regiões complicadas do mundo, como partes da África.

É impossível falar do legado desse dia de atribulação sem falar do melhor do espírito humano que sempre se revela nas catástrofes, como a solidariedade com totais estranhos, o valor dos que tentaram salvar vidas e cumprir seu dever e pagaram o preço máximo.

O Século XXI nasceu naquela manhã conturbada e atribulada, nasceu do sangue de inocentes, mas nasceu humano como todos os anteriores, nasceu corajoso e covarde, lúcido e fanático, heróico e vil, transigente e intolerante. Um legado pouco explorado dessa tragédia é nos lembrar de como a condição humana é efêmera, que nem prédios de aço e concreto são permanentes, então assim pode-se extrapolar que até mesmo o ódio que nasceu nesse dia e que o gerou não são eternos e que a capacidade de mutação de transição não obstante o esforço dos que querem refrear a esse fenômeno.

Há esperança no final, mas uma esperança rescaldada pelos conhecimentos que nos levam, a saber, que avanços em torno do entendimento demandam esforço político e tempo, e ainda que esse seja o objetivo final a convivência pacifica e o entendimento os estados não podem se permitir ou transigir com o terrorismo já que sua função de existência proteger seus cidadãos.

Mas creio que o dia de hoje não se presta a análises conjunturais ou sobre a natureza estratégica ou filosófica do terrorismo, mas sim lamentar os inocentes, mortos nos ataques desse dia infame, mas também, todas as vítimas do terrorismo de todo lugar seja no Brasil, na Colômbia, no Peru, no México, na Indonésia, na Índia, no Reino Unido, na Europa, em Israel, na Palestina, nos EUA, em resumo as vitimas em toda parte do mundo, por que essas mortes sem sentido são uma perda para toda a humanidade. Não importa qual a justificativa, qual causa e quão nobre se julgavam os atacantes.

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