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Jus esperneandi

Quando eu decidi me mudar para uma pacata cidade de 50.000 habitantes no norte de Minas Gerais, chamada Pirapora, o choque foi grande para os meus amigos mais íntimos que encaravam a proposta como delírio ou chacota minha.

Estava plenamente ciente das dificuldades a minha frente de adaptação, principalmente quanto ao ritmo de vida, mas parecia-me uma boa alternativa, para cuidar da saúde, e da família. Havia acabado de muito, mas bota muito a contragosto fechar minha consultoria em relações internacionais na Capital Federal, que embora recém chegada ao mercado, era promissora, mas era um projeto a seis mãos e por pacto nosso e pelo respeito enorme e admiração que tenho por minhas sócias (serão sempre para mim), tive que assim o fazer.

E então estava eu a deriva na vida, finalmente tendo que lidar com sentimentos que esmagava com trabalho, finalmente tive que lidar de frente com a perda do meu pai, com as mudanças em minha vida, com outras derrotas que a vida me impôs, com dificuldades que serão por um bom tempo ainda muito presentes no meu dia-a-dia, mas esse não é um blog de lamentações ou de suspiros pouco interessantes sobre a vida de individuo bem desinteressante desse ponto de vista de folhetim, ou seja, um sujeito cuja vida não é interessante, para que relatos efêmeros sobre o que me ocorre diariamente seja útil se não para poucas fofoqueiras, ou ex-namoradas que queiram manter um track sobre minha vida. Hipóteses deliciosamente fantasiosas devo dizer.

Voltando a narrativa que fazia, ao me mudar para essa cidade que por vezes é indistinguível de outras milhões no planeta, não fosse minha vista privilegiada para o Velho Chico, rio que me faz sentir conectado a gerações passadas da minha família e a outros milhões de ribeirinhos, desse que nos meus tempo de ensino primário (creio ser ensino fundamental agora) era chamado de rio da integração nacional, pelos livros de estudos sociais e geografia.

Esse estilo de vida que me refiro como exílio auto-imposto tem seus benefícios entre eles uma qualidade de vida que dificilmente se encontra nos centro urbanos maiores, e ainda conta a cidade com alguns recursos que a tornam menos isolada, há hospitais, universidades próximas, algumas alternativas de lazer (nada comparado a uma grande metrópole).

Há, contudo, um aspecto de minha vida aqui que tem sido gerador de frustrações além do que jamais poderia imaginar, as dificuldades de manter-se conectado ao mundo pela internet, a pouquíssima disponibilidade de cobertura ADSL, e os constantes apagões da minha internet via rádio, que mais parece via carro de boi. Frustrante por que todo o clima da cidade é convidativo a análise das relações internacionais, por que mesmo aqui a beira do Rio São Francisco a globalização deixa suas marcas, o comércio internacional é fonte de prosperidade e oportunidades de negócios existem, ou seja, é para o analista em mim terreno fértil para ter idéias, ainda mais com a natureza a inspirar, o silêncio a colaborar, até a angustiante distancia dos amigos ajuda, ao dar-me tempo para leitura, para me dedicar a esse blog, enquanto persigo as oportunidades que se apresentam.

Mas, do que adianta isso se não consigo manter-me conectado de maneira a desenvolver uma maior divulgação do blog e de outras iniciativas, não consigo me comunicar com os mestres que tanto me ajudam, com os colegas de profissão.

Não esse texto não é um desabafo, ou uma prova de que não posso me adaptar a vida no interior é apenas o meu exercício do meu direito de espernear, de ficar enfurecido, com a incapacidade técnica, que não permite que eu lance, por exemplo, meu site pessoal, que eu busque material para apontar reforçar meus pontos de vista, ou prová-los superados fazendo com que eu os reveja.

É sem duvidas irritante. Ainda mais por que tenho aprendido tanto, seja com o blog e o feed back que recebo, seja com o pessoal da editoria do mondo post, seja nos debates por vezes acalorados nas comunidades e fóruns.

Pode ser que eu esteja sofrendo de uma mal dos novos tempos, talvez ficar sem banda larga seja o novo mau do século. Não sei se chega a tanto, mas é um atraso, para os negócios (que tanto estão sofrendo com a marolinha), como para esse blog, que não deixo de encarar profissionalmente. Não o encaro como uma publicação solta e desconexa, mas como um espaço de relacionamento virtual com meus pares e com os interessados na área. Encaro com responsabilidade o que aqui escrevo, sei que não sou ainda (esperança ou arrogância, vocês decidem) um grande formador de opinião ou fonte de insights para muitos, mas me conduzo como se assim fosse.

E me pego pensando do que adianta me cobrar tanto, se nem ficar on line consigo, mas não serão os mistérios dos sufixos de DNS, das ondas de rádio que farão essa nossa (digo nossa por sem leitores isso seria de uma futilidade retumbante) empreitada esmorecer, enquanto a normalidade não se restaura, vou esperneando, que é direito garantido.

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