Pular para o conteúdo principal

Brown e Lula ou Sobre Dumping, subsídio e medidas compensatórias

Todos a essa altura já ouviram, leram ou assistiram que o Presidente Lula e o Primeiro Ministro Britânico Gordon Brown estiveram juntos hoje, não vou me ater ao caráter étnico ideológico acerca do ‘blame game’ do Presidente Lula, mas abordarei outro tema da agenda do encontro. (na verdade são muitos os temas que serão abordados nos próximos dias que tem relação direta e indireta com os temas tratado pelos Mandatários)

Falavam os Líderes hoje em reunião preparatória a vindoura reunião do G-20 (econômico, não confundir com o G 20 das negociações agrícolas da Rodada Doha), há certa altura Brown falou das regras de comércio e que se arrole os países-membros não cumpridores dos acordos de liberalização, mormente os acordos no arcabouço da OMC.

Uma questão paralela a essa é quais são as ferramentas jurídicas que existem para coibir as violações de comércio. São duas as medidas as revisões de política comercial realizada em intervalos regulares pela OMC e o recurso ao Sistema Formal de Solução de Controvérsias da OMC, tema que já tratei aqui, no sentido de como funciona o processo, agora creio seja conveniente abordar o marco legal desse sistema em que seu cerne figura em torno dos Acordos Antidumping, Sobre Subsídios e Medidas Compensatórias e Sobre Salvaguardas, embora compromissos especiais façam parte de acordos específicos como, por exemplo, o Acordo sobre Agricultura (que abordo aqui em uma série de posts a ser completada)

Defesa Comercial é o nome que se dá a utilização dos pressupostos legais previstos nos Acordos Antidumping, Sobre Subsídios e Medidas Compensatórias e Sobre Salvaguardas, para proteger a indústria doméstica em caso de práticas desleais, ou surtos de importação.

Nesse sentido é preciso definir que indústria doméstica é a totalidade dos produtores nacionais de produto similar ao importado ou o conjunto de produtores cuja produção da referida mercadoria constitua parcela significativa da produção nacional. O termo indústria é entendido nos acordos de uma maneira abrangente incluindo produtores agrícolas, por exemplo.

Outro conceito que deve ser salientado é o de Produto nacional similar ao importado, que é entendido segundo os acordos da OMC como sendo idêntico, ou seja, igual sobre todos os aspectos ao produto importado, que se está examinando ou um produto que na ausência do importado, mesmo não sendo idêntico sobre todos os aspectos, apresente características muito próximas as do produto importado.

Dumping é a introdução no mercado doméstico do país importador a preço (preço de exportação) inferior ao praticado nas vendas no mercado interno (valor normal). Valor normal é o preço ex-fábrica de um produto igual ou similar ao do produto em investigação.


Margem de dumping absoluta é a diferença aritmética entre o valor normal e o preço de exportação no país de origem:

md= vn – pe
md – margem de dumping absoluta
Pe – preço de exportação (FOB)
Vn – valor normal


Margem de dumping Relativa é a razão entre md e o preço FOB de exportação do produto. Se for inferior a 2% inviabiliza a ação antidumping por ser uma margem inferior a cláusula de minimis: (como explicado em nota de rodapé em outra postagem)

MD = md/PFOB
MD – margem relativa
md – margem absoluta
PFOB – preço de exportação FOB

O processo de investigação será encerrado sem a aplicação de direito quando não for comprovado o dumping ou o nexo entre esse e o prejuízo a indústria nacional e quando total do comércio do bem objeto de dumping for inferior a (3%) três pontos percentuais.

Subsídio é a concessão de um benefício, em função das seguintes hipóteses:

a. haja, no país exportador, qualquer forma de sustentação de renda ou de preços que, direta ou indiretamente, contribua para aumentar as exportações ou reduzir importações de qualquer produto; ou
b. Haja contribuição financeira por parte de entes públicos no interior do país exportador.

É acionável, isto é sujeito a medidas compensatórias, se for específico, sendo todo subsídio específico proibido, a não ser que explicitado em acordo.

É especifico se:

For vinculado, de fato ou de direito ao desempenho exportador; e/ou
For vinculado, ao uso preferencial de componentes nacionais em detrimento dos estrangeiros
.

Não-acionáveis são os subsídios não específicos logo não são alvo de medidas compensatórias, e os assim classificados nos acordos específicos.

Não é especifico se:

i. For concedido a atividades de pesquisa, exceto quando relacionado a aeronaves civis
ii. For concedido para assistência a regiões desfavorecidas.
iii. For concedido para promover adaptações a instalações por força de legislações ambientais


Um processo de investigação de subsídio se encerrará sem a aplicação de um direito compensatório quando não houver provas da existência do subsidio ou do nexo entre esse e o prejuízo a indústria nacional, quando o subsidio for inferior a (1%) um ponto percentual, ou (2%) dois pontos para países em desenvolvimento, ou quando o total do comércio do bem objeto de subsidio for inferior a (3%) três pontos percentuais, sendo considerado insignificante.

Medidas Compensatórias são medidas que visam cessar o dano provocado a indústria local ocasionados por subsídios ilegais e acionáveis, a partir da margem de subsídio, deve se provar por meio do devido processo legal a existência de subsídio sua especificidade e seu dano a indústria acima dos níveis de minimis.

Salvaguardas são medidas de caráter não seletivo e temporário, na forma de elevações tarifárias ou limitações quantitativas, que têm como objetivo proteger uma indústria doméstica de prejuízo grave causado ou que possam ser causados por importações crescentes, ou surtos de importação. Medida aplicada por meio de alíquotas ad valorem, ou por restrições quantitativas ou conjugação de ambas. Deve haver processo de investigação anterior a autorização para aplicação da medida, mediante um plano de ajuste de competitividade para o setor.

São dignos de nota, também, os princípios aplicados tanto na elaboração dos tratados como na sua interpretação e nos processos de investigação que são os princípios gerais da transparência e da publicidade. O que garante que as medidas compensatórias, antidumping e de salvaguarda só serão aplicadas depois do devido processo, garantindo a todas as partes o direito e a oportunidade de defender seus interesses. E de resolver seus conflitos de maneira negocial, por meios dos bons ofícios e outros tipos de contatos diplomáticos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Crise no Equador

Sob forte protesto das forças policiais e parte dos militares, que impedem o funcionamento do aeroporto internacional de Quito. Presidente Correa cogita usar dispositivo constitucional que prevê dissolução do Congresso e eleições gerais. Mais uma grave crise política na América do Sul. Numa dessas coincidências típicas de se analisar as coisas internacionais discutia semana passada numa excelente postagem de Luís Felipe Kitamura no laureado blog Página Internacional a situação equatoriana. A postagem tinha como título Equador: a instabilidade política e suas lições . Na qual o colega discorria sobre o péssimo histórico de conturbação política do país andino e sobre como o governo Correa parecia romper com isso usando a receita da esquerda latina de certo pragmatismo econômico e políticas distributivas. Mas, justamente a instabilidade política que parecia a caminho da extinção volta com toda força em um episódio potencialmente perigoso, que contundo ainda é cedo para tecer uma análise

Meus leitores fiéis, pacientes e por vezes benevolentes e caridosos

Detesto falar da minha vida pessoal, ainda mais na exposição quase obscena que é a internet, mas creio que vocês merecem uma explicação sobre a falta de manutenção e atualização desse site, morar no interior tem vantagens e desvantagens, e nesse período as desvantagens têm prevalecido, seja na dificuldade na prestação de serviços básicos para esse mundo atual que é uma boa infra-estrutura de internet (que por sinal é frágil em todo o país) e serviço de suporte ao cliente (que também é estupidamente oferecido pelas empresas brasileiras), dificuldades do sub-desenvolvimento diria o menos politicamente correto entre nós. São nessas horas que vemos, sentimos e vivenciamos toda a fragilidade de uma sociedade na qual a inovação e a educação não são valores difundidos. Já não bastasse dificuldades crônicas de acesso à internet, ainda fritei um ‘pen drive’ antes de poder fazer o back up e perdi muitos textos, que já havia preparado para esse blog, incluso os textos que enviaria para o portal M

Extremismo ou ainda sobre a Noruega. Uma reflexão exploratória

O lugar comum seria começar esse texto conceituando extremismo como doutrina política que preconiza ações radicais e revolucionárias como meio de mudança política, em especial com o uso da violência. Mas, a essa altura até o mais alheio leitor sabe bem o que é o extremismo em todas as suas encarnações seja na direita tresloucada e racista como os neonazistas, seja na esquerda radical dos guerrilheiros da FARC e revolucionários comunistas, seja a de caráter religioso dos grupos mulçumanos, dos cristãos, em geral milenaristas, que assassinam médicos abortistas. Em resumo, todos esses que odeiam a liberdade individual e a democracia. Todos esses radicais extremistas tem algo em comum. Todos eles estão absolutamente convencidos que suas culturas, sociedades estão sob cerco do outro, um cerco insidioso e conspiratório e que a única maneira de se resgatarem dessa conspiração contra eles é buscar a pureza (racial, religiosa, ideológica e por ai vai) e agir com firmeza contra o inimigo. Ness