Li certa feita uma provocação muito pertinente em um excelente artigo do renomado professor Amado Luiz Cervo* (que já tive o prazer de conhecer pessoalmente mais de uma vez se isso é possível, muito embora, tenha certeza que o professor não se recorda de mim). Ele propunha um debate intelectual sobre conceitos e teorias.
Não me vejo (e não é caso de falsa modéstia) como capaz de responder a essa provocação de maneira profunda e até mesmo satisfatória, contudo é um debate que vale a pena ser travado. Ainda mais no dogmático campo das relações internacionais. Onde boa parte da formação universitária é devotada à compreensão de pressupostos e paradigmas e de recapitular as batalhas epistemológicas que construíram o corpo da chamada Teoria das Relações Internacionais.
Quão válidos são os mecanismo de teóricos que estudamos? Quão profunda é a capacidade de uma teoria de decodificar comportamentos, prever conflitos e condutas? O quanto nossos próprios filtros culturais impendem à percepção do alcance de um postulado (tido como válido por nós, mas empiricamente reprovado). O choque de civilizações, inevitavelmente conflituoso, consegue explicar ações cooperativas de países emergentes como Brasil, Índia, China e Rússia, por exemplo?
O autor acredita que são os conceitos sem pretensões universalistas (impraticáveis por causa das lentes culturais), uma maneira de superar a limitação das teorias, embora deixe claro que os conceitos são formulados país a país. E buscar entender como são formulados e quais são esses conceitos podem ser a chave para decodificar as relações internacionais desse determinado país.
É claro que o desenvolvimento de uma corrente de pensamento necessita de massa crítica e que a formulação desses conceitos é uma construção coletiva, ou seja, uma construção que necessita do debate e do embate intelectual para se adensar nesse sentido o autor afirma textualmente:
“Por mais pretensioso** que se apresente, o intelectual que lida com as relações internacionais não arranca de sua mente o conceito acabado. A contribuição pessoal é relevante, na medida em que a destilação de conceitos, o arranjo, a tipificação e a conexão evolutiva, uma soma de tarefas da qual resulta a síntese superior, pertence ao autor, que por vezes acrescenta de próprio. Algo semelhando ocorre no campo das teorias, como bem sabem os estudantes de relações internacionais: num extremo, manuais que expõem as teorias alheias; em outro, criações originais e pessoais; no meio situa-se nosso procedimento, uma sistematização de conceitos extraídos, seja de determinada praxis, em viagem do empírico ao abstrato, seja de determinada inteligência elaborada coletivamente.” CERVO (2008, p 14.)
Tenho enraizada, em mim, a noção que depende de nós os interessados em relações internacionais, os consultores, os empresários e sobretudo os estudiosos pesquisadores e professores decodificar anseios e necessidades nacionais e formular ou influenciar a formulação da política externa nacional e das interações não estatais.
Será um pensamento não teórico, mas conceitual o caminho? Fica a reflexão.
_________________________
*CERVO, Amado Luiz. Conceitos em Relações Internacionais. Rev. bras. polít. int., Brasília, v. 51, n. 2, dez. 2008.
**Não posso deixar de dizer que essa tendência existe em todos nós e em mim, ou por que estaria eu criando um blog. [nota de rodapé minha]
Comentários
Gostei do blog.
Prazer, Agatha, também sou estudante de Relações Internacionais e Direito.